Eu tinha chegado ao Brasil há poucos dias. A apresentação das minhas cartas credenciais ao presidente Lula estava muito atrasada, devendo aguardar ainda meses.
Um dia, para minha surpresa, o chefe do "Cerimonial" (o nome brasileiro para Protocolo) convidou-me a estar presente no almoço oficial que o presidente Lula oferecia ao presidente do governo espanhol, José Luiz Zapatero. Era um gesto de inusitada simpatia para com o representante diplomático português, porque um embaixador não "existe" oficialmente, perante um chefe de Estado, antes de apresentar as credenciais. Mas as relações luso-brasileiras têm destas simpáticas sublitezas.
No final do almoço, o chefe do Cerimonial, Ruy Casaes, quis ter a acrescida amabilidade de me apresentar ao presidente e ao seu convidado. Lula da Silva deu-me as boas-vindas, de forma bastante calorosa e logo inquiriu:
No final do almoço, o chefe do Cerimonial, Ruy Casaes, quis ter a acrescida amabilidade de me apresentar ao presidente e ao seu convidado. Lula da Silva deu-me as boas-vindas, de forma bastante calorosa e logo inquiriu:
- Embaixador, qual é seu "time", em Portugal?
- Sou de um clube essencialmente católico, presidente.
Deixei passar uns segundos e, perante a perplexidade dos presentes, expliquei que era do Sporting, "um clube que só ganha quando Deus quiser".
Lula deu uma gargalhada e disse que conhecia melhor o Benfica e o Porto.
Nesse ponto da conversa, Zapatero - que não me pareceu muito conhecedor de futebol - puxou o assunto para Pélé, afirmando a grande admiração que tinha pelo jogador, que tinha visto jogar em seleções brasileiras.
Lula comentou então:
- O presidente Zapatero sabe que Pélé não fazia parte daquele que é, ainda hoje, considerado como o melhor "time" que o Brasil alguma vez teve?
- O presidente Zapatero sabe que Pélé não fazia parte daquele que é, ainda hoje, considerado como o melhor "time" que o Brasil alguma vez teve?
Aí, eu intervim:
- Está a referir-se ao "time" do Chile, em 1962, presidente?
Lula fez uma cara de quem estranhava bastante que eu soubesse esse preciosismo e retorquiu:
- O embaixador lembra-se do "time" do Chile?
- Muito bem, presidente. E, por acaso, o presidente recorda-se dos jogadores que compunham esse "time"'?
Lula deve ter achado algo impertinente a minha observação, mas lá adiantou:
- Tinha o Zózimo, o Amarildo, o Garrinha...
Agarrei a oportunidade e "arrasei":
- Presidente, talvez valha a pena começar pelo princípio: Gilmar; Djalma Santos, Mauro e Nilton Santos; Zito e Zózimo; Garrincha, Didi, Vává, Amarildo e Zagalo.
Zapatero estava sem perceber nada. Lula exibia um sorriso espantado e, por um instante, deve ter pensado que Portugal teria decidido mandar para o Brasil um técnico de futebol, em lugar de um embaixador.
- Mas como sabe isso, embaixador? Por que conhece todo esse "time" brasileiro?
- Mas como sabe isso, embaixador? Por que conhece todo esse "time" brasileiro?
Expliquei então ao presidente Lula uma coisa que ele provavelmente desconhecia, mas que, estou seguro, não esqueceu mais:
- Sabe, presidente, a minha geração, em Portugal, quando a nossa seleção nacional não estava numa "copa" do Mundo, tinha o Brasil como a "sua" seleção. E, por isso, eu conhecia muito bem todo o vosso "time", porque o "time" do Brasil era o meu "time".
(Não disse ao presidente Lula que esse "time" do Chile era, por mero acaso, o único que eu sabia totalmente de cor...).
(Não disse ao presidente Lula que esse "time" do Chile era, por mero acaso, o único que eu sabia totalmente de cor...).
A partir daí, e nos quatro anos seguintes, várias vezes conversei com o presidente Lula sobre futebol, a maioria das vezes sobre a sorte do seu Corinthians. E, infelizmente, nunca encontrei uma boa razão para lhe voltar a falar no meu Sporting...
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