quinta-feira, 26 de junho de 2014

duas ou três coisas

 

Alexander Stubb

Posted: 24 Jun 2014 05:14 PM PDT

Durante a negociação europeia do Tratado de Nice, que dirigi durante o primeiro semestre de 2000 e que acompanhei até à conclusão dos trabalhos, como chefe da delegação portuguesa, no resto do ano, o tema das "cooperações reforçadas" ou da "flexibilidade" (para simplificar: a possibilidade de só alguns Estados adotarem certas políticas dentro da União) foi umas das questões centrais. Graças à genialidade criativa de Josefina Carvalho, a diplomata portuguesa mais competente que alguma vez conheci em matérias institucionais europeias, e que por sorte me coadjuvava, colocámos sobre a mesa um conjunto "engenhoso" de propostas. Portugal foi mesmo a "vedeta" dessa discussão, que António Guterres depois titulou à mesa do Conselho europeu. 

 

Algumas delegações revelaram um interesse muito grande pelo tema e ajudaram a desenvolvê-lo, com inteligência e argúcia. Uma dessas delegações era a finlandesa, dirigida por um homem magnífico, com uma serenidade ártica, o embaixador Antti Satuli, um bom amigo infelizmente já desaparecido. Costumávamos dizer que a Finlândia desse tempo era quase um país do Benelux (Bélgica, Holanda, Luxemburgo), tal o sentido europeu do seu empenhamento, o sentimento federal das suas posições (onde isso vai...) Antti era então coadjuvado por um muito jovem diplomata, entusiasta, imaginativo, quase "latino", que com a nossa delegação mantinha uma relação de grande cordialidade. Longas conversas tivemos com ele, procurando convencê-lo do bem fundado das nossas propostas e, por vezes, tentando integrar algumas das suas ideias. Que eram muitas, porque o tema da "flexibilidade" apaixonava-o.  

 

Em 2002, já a negociação tinha terminado e eu vivia na Áustria e andava já por outras "guerras", recebi um pedido desse diplomata finlandês para poder utilizar um texto meu num livro que ia publicar sobre a questão da "flexibilidade". Enviou-me o livro meses depois, com uma carta muito simpática. Trocámos, depois disso, alguns emails e fui, entretanto, acompanhando o seu percurso, agora na política, de Estrasburgo ao governo do seu país, onde chegou a ministro dos Assuntos europeus e dos Negócios estrangeiros.

 

Alexander Stubb, o nosso jovem amigo finlandês das negociações europeias, é, desde ontem, o novo primeiro-ministro do seu país.

BES

Posted: 24 Jun 2014 01:43 PM PDT

Nos dias que correm, os bancos não são empresas como quaisquer outras. A banca está definitivamente colocada no centro do processo económico-financeiro europeu e não é por acaso que, nos últimos anos, é em seu torno que se desenvolvem os grandes debates da União. Os contribuintes europeus já sofreram na pele o custo da irresponsabilidade de alguns operadores bancários e os efeitos detrimentais das suas ações na estabilidade global do sistema. Os bancos parece serem privados enquanto dão dinheiro, mas passam a problemas públicos quando entram em crise.

 

Por essa razão, não é legítimo que os agentes políticos portugueses olhem para a crise no BES como se isso significasse apenas um emergir de problemas conjunturais numa qualquer empresa privada. O governo sabe que as coisas não são assim e, em nome dos cidadãos - e dos contribuintes - que representa tem de dar mostras claras de estar atento a uma saga que não se esgota nos meandros da família Espírito Santo. Longe disso! O argumento da separação de interesses não é válido e não pode ser esgrimido com ligeireza. Ou alguém tem dúvidas de que, se as coisas acaso correrem mal, alguém nos virá cobrar ao bolso? Deixemo-nos, pois, de formalismos ridículos e assumamos a importância destas coisas.

 

Neste contexto e nos dias que correm, a família Espírito Santo pode não estar à altura da responsabilidade do nome que herdou. As explicações absolutamente incríveis dadas sobre o que ocorreu na gestão dos interesses da estrutura financeira no Luxemburgo, somadas à patética irresponsabilidade revelada em Angola, agravadas pelas dissidências e conflitos públicos entre os familiares, que deveriam mostrar solidez e determinação num momento desta delicadeza, provam que estamos perante um grupo em real crise de liderança e objetivos. E ao ter optado por uma solução de continuidade, titulada em alguém que está ainda sob suspeita, não revela bom-senso e faz temer o pior, agora para o banco.

 

Espera-se que o supervisor, o Banco de Portugal, seja capaz de tomar as decisões que possam acautelar o interesse público. Com firmeza, transparência e sentido de responsabilidade.

 

 

quarta-feira, 25 de junho de 2014

Alerta Total

 

Petralhas são investigados em 314 casos de corrupção, mas derrota virá de percepção negativa na economia

Posted: 24 Jun 2014 06:57 AM PDT


Edição do Alerta Total – www.alertatotal.net
Por Jorge Serrão - serrao@alertatotal.net

O Partido dos Trabalhadores tem 314 casos sendo investigados pela Justiça, Ministério Público, Polícia Federal, Receita Federal e Tribunal de Contas da União. O santo nome do mito Luiz Inácio Lula da Silva é citado em pelo menos 10 situações. A Presidenta Dilma Rousseff aparece em 7. Os números assustadores do grau de corrupção no setor público, envolvendo a classe política, são tabulados por grandes escritórios de Lobby, que prestam assessoria aos políticos e partidos, em Brasília.

O PT e seus dirigentes não figuram sozinhos no levantamento sobre broncas que poderiam acabar em condenações criminais, cíveis ou administrativas, se o Brasil não fosse o País da Impunidade. O PTB, que abandonou o PTitanic, é investigado em 125 situações. O PMDB, que se divide entre Dilma e Aécio Neves para ser "sempre governista", é alvo de 72 inquéritos ou processos. O PSDB, que tenta cristalizar o voto anti-petista, tem 47 problemas sob investigação. Até o PSOL, com o discurso moralista de esquerda, tem 7 casos sob apuração.

A preocupação dos políticos e dirigentes partidários só não é maior porque, no final das contas, nada acontece de concreto contra os eventuais infratores. Geralmente, investigações escabrosas não se concluem, em tempo hábil, no Brasil da Injustiça Sistêmica. A maioria dos casos cai no esquecimento da opinião pública. A falta concreta de provas para condenar, apesar dos indícios e evidências, facilita o esquema de impunidade. Quando algum caso chega a condenação, infindáveis recursos, que podem durar décadas nos tribunais, geram prescrição das penas.

Apesar da onda de corrupção constatada pela opinião pública e publicada, afetando negativamente o humor do eleitorado, os políticos sabem que tal problema não é decisivo na hora do eleitor sentar o dedo na urna eletrônica. A percepção econômica é quem define a decisão final de quem vai votar. Quem se sente beneficiado economicamente ou pelo clientelismo com a máquina pública tende a votar com o governo. Já quem sente dificuldades com a conjuntura econômica, por aumento do custo de vida, alta de impostos, dificuldades na hora de pagar dívidas ou o sumiço do dinheiro na hora de fazer compras no dia-a-dia, acaba apostando na "oposição".

A percepção e a sensação concreta de que a economia tem problemas, por má gestão, corrupção ou incompetência conceitual da política econômica, são os fatores que sacramentarão a derrota reeleitoral de Dilma Rousseff. A pecha de corrupção cristalizada sobre a petralhada tem um efeito desmoralizante secundário. Se tudo estivesse bem na economia, o PT ganharia facilmente a Copa Reeleitoral. Vai perder, com chances de levar uma goleada, não por mérito da "oposição". A derrota é porque a maioria sente que o pirão econômico desandou ou vai desandar se o mesmo esquema de desgovernança continuar em vigor.

O jogo eleitoral já está decidido no Brasil, da mesma forma de sempre. A política econômica, tradicionalmente imposta de fora para dentro, sofrerá ajustes para que tudo continue sob controle da oligarquia financeira transnacional e seus cartéis. Eles comandam o sistema Capimunista no Estado tupiniquim – que não tem previsão de sofrer mudanças, mantida a mesma ordem política atual. Ganhará a eleição de 2014, como sempre, quem for ungido e patrocinado pelo esquema transnacional de poder.

O PT promete sair reagindo, radical e violentamente, à perda do poder federal. Se a reação petista e petralha afetar profundamente os interesses da oligarquia financeira transnacional, seu esquema será dizimado. Caso deixe o poder, na base do jeitinho brasileiro, deixando aberta uma portinha para um futuro retorno, tudo fica como dantes, sob pretensa nova direção. O movimento do PT e seus aparelhos ideológicos, radical ou light, ditará o que vai acontecer no Brasil daqui para frente.

Uma coisa é consenso entre governistas e oposicionistas. O ano de 2015 não será fácil do ponto de vista econômico. Demandará ajustes – na ótica da oligarquia financeira transnacional – para que o Brasil não entre em uma crise. Se os petistas, PTs da vida com a perda do poder, partirem para a porrada, a situação pode caminhar para uma ruptura institucional.

Nessa conjuntura de caos, tudo pode acontecer. O mais fácil é que alguns daqueles 314 casos sob investigação (e muitos mais que podem surgir, a qualquer momento) acabem dando em alguma coisa, tal como aconteceu com o "justiçamento" político do Mensalão – que puniu alguns gatunos pingados, sem chegar ao chefe real da gang. Se a petralhada, perdendo a eleição, também perder a cabeça, pode, literalmente, ficar sem ela... 

Sentimento de mudança


Como hoje é Dia de São João, dia de dançar quadrilha, fica sempre a esperança que chegue logo o dia em que as quadrilhas vão dançar no Brasil.
 
Adeus, Imortal?

 
Notícia divulgada pelo jornal O Globo, comemorada nos meios políticos mais que gol da seleção brasileira na Copa do Jegue:

"O ex-presidente e senador José Sarney (PMDB-AP) não deverá se candidatar à reeleição em outubro. A informação foi divulgada nesta segunda-feira pelo assessor dele no Amapá e confirmada ao GLOBO pelo presidente do PMDB no estado, o ex-senador Gilvam Borges. Segundo Borges, a primeira pessoa a saber da desistência de Sarney — pela boca do próprio — foi a presidente Dilma Rousseff, com quem o ex-presidente viajou de Brasília para Macapá.

Bem que muitos outros políticos poderiam seguir o bom exemplo do companheiro Sarney...

Erremos, mas consertemos – arquitetonicamente


Na notinha de ontem, "Aquartelando-se, FHC?",  cometemos uma impropriedade, ao desinformar que o projeto do quartel general do Ibirapuera foi do arquiteto comunista Oscar Niemeyer.

Na verdade, o projeto do QG do Comando Militar do Sudeste, em São Paulo, é do arquiteto Paulo Bastos, também de esquerda, no ano de 1965.

A versão engraçada da história é que Bastos, amigo de vários oficiais, se aproveitou de que o Exército precisava de projetos arquitetônicos e, enquanto ficou "encarcerado" politicamente pelo regime de 64, chegou a montar "um escritório" no QG para seu trabalho voluntário...

O arquiteto Paulo Bastos faleceu em 28 de fevereiro de 2012, aos 76 anos.

Sem retoques



Bola fora!

Afirmar que a Copa do Mundo da Fifa alavancaria negócios não corresponde à avaliação da indústria gráfica sobre os efeitos do evento.
 
A pesquisa Sondagem da Indústria Gráfica, realizada nacionalmente pela Associação Brasileira da Indústria Gráfica (Abigraf), revela que os empresários do setor são unânimes na opinião de que a Copa afetará negativamente o setor.
 
O presidente nacional da Abigraf, Levi Ceregato, justifica o ceticismo:
 
"Esses eventos colocam o País em compasso de espera, com investimentos sendo adiados, o que prejudica os negócios. Além disso,  o excesso de feriados neutraliza o eventual aumento de demanda".
 
Pisando na bola

 
Bola duvidosa
 
A Seleção Brasileira da CBF voltou a mostrar os mesmos defeitos dos dois jogos anteriores, na vitória fácil sobre Camarões, em Fortaleza.
 
O time do Felipão continua lento nas saídas de bola, erra muitos passes, acomodado demais no posicionamento em campo, sem jogadas bem ensaiadas, ficando dependente de talentos individuais, como o de Neymar, para fazer gols.
O duro é que, mesmo assim, o time tem chances de vencer a Copa (para delírio da torcida petralha ou não), se conseguir ganhar jogos aos trancos e barrancos...

Motogirl



É altíssimo o risco de uma derrapagem, com tais pilotos...

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O Alerta Total tem a missão de praticar um Jornalismo Independente, analítico e provocador de novos valores humanos, pela análise política e estratégica, com conhecimento criativo, informação fidedigna e verdade objetiva. Jorge Serrão é Jornalista, Radialista, Publicitário e Professor. Editor-chefe do blog Alerta Total: www.alertatotal.net. Especialista em Política, Economia, Administração Pública e Assuntos Estratégicos.
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A transcrição ou copia dos textos publicados neste blog é livre. Em nome da ética democrática, solicitamos que a origem e a data original da publicação sejam identificadas. Nada custa um aviso sobre a livre publicação, para nosso simples conhecimento.

© Jorge Serrão. Edição do Blog Alerta Total de 24 de Junho de 2014.

A Grandeza do Brasil

Posted: 24 Jun 2014 06:32 AM PDT


Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
Por Carlos Maurício Mantiqueira
 
A grandeza do Brasil é tão extraordinária que surpreende até mesmo o mais experimentado observador.
 
Grande por seu território e pela generosidade de seu povo.
 
Somos o resultado da soma de todas as características dos índios que já estavam e dos imigrantes que vieram.
 
Nossos antepassados viveram sob diferentes regimes de governo e de uma infinidade de leis. Assim, temos a mais rica possibilidade de evolução da espécie jamais imaginada.
 
Fazendo uma analogia da política com o mundo animal, vemos sem espanto os híbridos dos mais distintos bichos.
 
Anta com vaca, onça com hiena, porco com cachorro e asno com papagaio.
 
Ainda temos dificuldade em encontrar critérios e padrões estéticos para escolher o nosso preferido num concurso de beleza.
 
Isto por um lado é trágico.
 
Mas, por outro, é cômico.

Ainda mais em tempos de Copa, com a Pátria vestida de chuteiras...
 
 
Carlos Maurício Mantiqueira é um livre pensador.

Liberalismo ou Imperialismo

Posted: 24 Jun 2014 06:29 AM PDT


Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
Por Adriano Benayon
 
Ao nos ocuparmos das questões nacionais, não devemos nos precipitar, pois há pressa, e não se deve desperdiçar tempo em assuntos e discussões de importância secundária.  A situação é grave demais para que se tire o foco do que interessa.
 
Um tema que não deveria merecer muito gasto de nossa energia são as eleições presidenciais.   Em artigo recente, "Eleições e Modelo Dependente", escrevi: "O real sistema de poder manobra sempre para que todos os candidatos com chance de chegar ao 2º turno estejam comprometidos com a realização destes objetivos: ampliar e aprofundar a desnacionalização da economia, desindustrializá-la, servir a dívida -  inflada pela composição de juros absurdos – e  propiciar ganhos desmedidos às grandes empresas transnacionais."
 
Portanto, com  qualquer "eleito", a vitória será do sistema imperial e de saqueio, comandado pela oligarquia financeira angloamericana, através de carteis transnacionais e coadjuvada por concentradores locais.
 
Sessenta anos de atraso tecnológico aumentando e crescente perda de autodeterminação política e econômica geraram condições deterioradas de vida no País.
 
Essa deterioração tem sido acompanhada por doses maciças de desinformação, sendo a natural revolta popular manipulada por opositores diretamente vinculados àquela oligarquia financeira e principalmente por entidades controladas por esta, que agem para desestabilizar a presente gerência petista.
 
Esta, na verdade, atende ao sistema de poder da oligarquia, contra o qual a revolta deveria se dirigir.  É como culpar só o gerente do restaurante que manda servir alimentos estragados e que, se não o fizer, será sumariamente demitido.
 
De qualquer forma, não é tolerável  a lesividade das  políticas do atual governo, como: 1) os leilões do petróleo; 2) o agravamento da situação do setor de energia elétrica no quadro de um sistema predador, que se diz "de mercado"; 3) as parcerias público-privadas; 4)  novas elevações das absurdas taxas de juros dos títulos públicos, que sangram o Tesouro, em favor dos concentradores financeiros.
 
Há que denunciar também a continuidade:
 
1) das alienações de terras usadas predatoriamente, em grandes plantations,  para exportação; 2) da extrema desnacionalização da economia; 3) do favorecimento aos carteis transnacionais, praticantes de preços extorsivos e de transferência; 4) da liberdade de exportação, com baixa ou nula tributação, de inestimáveis recursos minerais, preciosos  e estratégicos, inclusive o nióbio, em que o pouco caso com os interesses nacionais recebe o  aval da CODEMIG,  estadual de Minas Gerais.
 
Entre os crimes mais graves das gerências petistas estão como os decretos e medidas para  liberar as sementes transgênicas e os agrotóxicos a elas associados.  A urgente proibição dessas sementes tem de ser exigida nas mobilizações populares sem as quais o processo de desintegração do País não terá solução de continuidade.
 
Mais de 800 cientistas de 82 países assinaram carta aberta, na qual pedem a suspensão imediata das licenças ambientais para cultivos transgênicos e produtos derivados, tanto comercialmente como em testes em campo aberto, durante ao menos cinco anos.
 
 
Eles proclamam: "as patentes dos organismos vivos, dos processos, das sementes, das linhas de células e genes devem ser revogadas e proibidas."
 
Apontam agrônomos e biólogos: "Se as abelhas desaparecerem da face da Terra, a humanidade terá apenas mais quatro anos de existência. Sem abelhas não há polinização, nem reprodução da flora; sem flora não há animais, sem animais, não haverá raça humana."
 
Isso não é  pouco, e  há mais que isso. Os cientistas confirmam que os cultivos transgênicos prejudicam os agricultores, inclusive por envolver o  aumento do uso de herbicidas e o empobrecimento do solo. Ademais, intensificam o monopólio das grandes empresas sobre os alimentos, o que está levando os agricultores familiares à miséria e impedindo a  segurança alimentar e a saúde no mundo.
 
Até mesmo nos EUA e no Reino Unido, fontes do próprio Estado  reconhecem o perigo dos transgênicos para a biodiversidade e a saúde humana e animal. A transferência horizontal de genes acarreta a difusão de genes que tornam incuráveis as doenças infecciosas e  criam vírus e bactérias causadores de doenças e mutações capazes de provocar o câncer.
 
Liberalismo ou imperialismo?
 
A oligarquia financeira mundial tem investido no Brasil – durante mais de um século, de forma crescente -  na (de)formação de opiniões e na deseducação, gerando confusão mental e animosidade entre grupos sociais e indivíduos, associadas a doutrinas e ideologias.
 
Os saqueadores e seus adeptos -  remunerados ou não -  encobrem a verdadeira natureza das  políticas que realizam o saqueio imperial, fazendo que até mesmo os críticos delas as qualifiquem de liberais e neoliberais.
 
Esses nomes não costumam causar repulsa geral e até  exercem atração sobre as pessoas que os associam a termos da mesma raiz, como "livre", libertário", "liberdade".  Palavras  bonitas e antigos ideários das revoluções francesa e norte-americana, que  passaram a ser evocados por mentores das políticas de escravização através da economia.
 
Do mesmo modo que as oligarquias nos países centrais, os defensores, no Brasil,  dos privilégios aos carteis transnacionais e de seus contatos coloniais ou semicoloniais também se dizem e são chamados de (neo)liberais.
 
Então, o que, na realidade, não passa de mera apropriação dos recursos naturais e dos frutos do trabalho de um país, fica sendo discutido como se fosse questão doutrinária.
 
O engodo é ainda maior, porque se atribui aos liberais ser contrários à intervenção do Estado, e porque a grande maioria das pessoas ignora que atualmente, na maioria dos países, o Estado é controlado pela oligarquia e que ele intervém, em favor desta, nas finanças e na economia.
 
Por causa disso - mas sem que o público perceba que é por isso -  o  Estado comporta-se como insaciável coletor de impostos e taxas, sem prestar serviços, nem investir bem, nem assegurar direitos sociais básicos.
 
A própria incompetência adrede instalada no Estado, serviu para fazer aumentar ainda mais a concentração predadora, através das privatizações.
 
Essas estão sendo desfeitas em alguns países como Rússia e França, enquanto no  Brasil o Estado só aumenta de tamanho como repassador de recursos a concentradores estrangeiros e locais.
 
Antes, tivemos excelentes avanços tecnológicos em estatais, mas elas foram sendo minadas para "justificar" as privatizações. Tudo em nome da "livre" iniciativa, na qual  carteis e monopólios sufocam a iniciativa, impedem a concorrência e apropriam-se das poucas tecnologias não impedidas de surgir.
 
Entretanto, nenhum país se desenvolveu sem a liderança do Estado, o único instrumento de a sociedade organizar-se para evoluir e defender-se, papel que ainda desempenha em alguns países, ainda que nem sempre a contento geral.
 
Sem o Estado a seu serviço, a sociedade  transforma-se em massa amorfa, composta por indivíduos sem personalidade e sem liberdade alguma, como ocorre no grande número de países dominados pela oligarquia financeira mundial, inclusive em suas sedes -   EUA, Reino Unido.
 
Assim, as instituições formalmente democráticas, mesmo quando não violadas por desestabilizações e golpes de Estado, ficam sob controle daquela oligarquia. Os "governantes" são prepostos ou acuados.
 
De fato, não existe democracia sob regimes que não estabelecem limite à concentração econômico-financeira.  A falsa que temos aqui leva à convulsão, com chance de o que vier depois, levar à guerra civil, à desintegração e a ainda maior submissão ao império mundial.
 
Portanto, nossa sobrevivência depende de os brasileiros não mais se deixarem pautar pela  agenda e pelos conceitos do império. Só começará a ser viabilizada, quando a consciência dos fatos deixar de ser obscurecida por ideologias,  e quando os brasileiros deixarem de repelir-se entre si por divergências de opinião, inclusive esquerda ou direita.
 
 
Adriano Benayon é doutor em economia e autor do livro Globalização versus Desenvolvimento.

A pobreza não é sinônimo de virtude

Posted: 24 Jun 2014 06:28 AM PDT


Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
Por Natalia Vilarouc
 
Vejo que a maioria das pessoas associa a pobreza a virtudes tais como humildade e perseverança. Levar uma vida difícil mesmo que isso não te leve a lugar algum é visto como uma aura incandescente capaz de dar autoridade para bater no peito e dizer "sou pobre com orgulho".

A prosperidade, no Brasil, é encarada com desconfiança e associada à torpeza de caráter. Se for rico provavelmente deve ter roubado ou sonegado tributos.
 
Mesmo que a criatura seja um homem desorganizado com suas próprias finanças, frequentador assíduo do bar, violento com esposa e filhos, sua imagem de "trabalhador" que ganha mais ou menos o salário-mínimo já é o suficiente para fazer florescer nas mentes intelectuais verdadeiras odes a essa criatura nada espirituosa.
 
E é claro que todas as outras circunstâncias são responsáveis pelos infortúnios da vida dele, menos suas ações diárias...
 
O rico é o malvado. Sempre. E haja impropérios para caracterizar seus atos. Todas suas escolhas pessoais diárias, tais como usar racionalmente seu dinheiro, trabalhar incansavelmente e visão de futuro na boca dos outros se transformam nas palavras de avareza, neurose e oportunismo.
 
E olhem que situação escabrosa: se o pobre ganhar algo (licitamente ou não) sem que seja fruto do seu trabalho, isto é válido. Porque ele é pobre e precisa. Mas se alguém com mais posses tentar proteger o que foi fruto de seu suor não passa de um sonegador de impostos, o mais vil dos devedores, egoísta miserável que não vê que sua riqueza tem que ser distribuída.
 
Não preciso ir muito longe para demonstrar que riqueza na mão de quem não produziu vai fácil. Vejam em quanto tempo dura a farra de alguém que acertou na loto. A pobreza não gera virtudes.
 
O que se dirá, entretanto, do espírito que busca a riqueza? Este alguém terá que ter força, perseverança, fé. Terá muitas vezes que renunciar ao imediatismo, a coragem será fundamental, a visão ampla também, sem falar na habilidade no trato com as pessoas.
 
Em suma: o espírito que busca a prosperidade é virtuoso.
 
 
Natalia Vilarouc é Graduanda de Direito da Universidade de Fortaleza (UNIFOR) e Especialista do Instituto Liberal.

Os dissidentes do socialismo real

Posted: 24 Jun 2014 06:25 AM PDT


"As feridas e os erros da esquerda precisam sangrar para que as insuficiências e incompreensões possam ser superadas" (José Genoino, ex-deputado federal, ex-guerrilheiro do Araguaia, atual hóspede da Papuda; "O Globo", 06 Fev 96)
 
Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
Por Carlos I. S. Azambuja
 
Quando alguém examina livros, revistas e folhetos dos partidos comunistas verifica um fato surpreendente. Em nenhuma parte da interminável verborréia que pretende abordar o político-social encontra-se qualquer referência ao indivíduo.
 
Página após página, encontram-se os termos "massas", "proletariado", "burguesia", "mercenários do capitalismo", "reformistas", "revisionistas", "renegados", e sempre, em toda a parte, referências à "vanguarda revolucionária", isto é, ao partido.
 
Sempre que qualquer membro do partido é referido, é esterilizado psicologicamente e tirada a sua individualidade: é convertido em "camarada", "companheiro" ou "quadro".
 
Não é por acidente que o ser humano está ausente dos escritos comunistas. O indivíduo não tem cabimento na teoria e nos programas dos partidos comunistas, pois a ideologia só se interessa pelo homem como membro de uma classe e, no que diz respeito ao programa partidário, os indivíduos são referidos como massas.
 
Na medida em que o indivíduo siga sendo ele mesmo, diz-se que está animado por interesses e esperanças pessoais; é sensível às dúvidas e ao otimismo; é capaz de ser tocado pelo mistério da vida; torna-se imprevisível e capaz de ater-se às suas próprias opiniões.
 
As mesmas qualidades que fazem dele um indivíduo, o desqualificam para os fins partidários. Tende demasiado a não ser facilmente convencido, a mostrar-se céptico, a aborrecer-se pelas reiteradas abstrações próprias da ideologia comunista, a duvidar do método, a manter uma opinião ainda mesmo depois de se ter convertido à "linha partidária" e a simpatizar ou antipatizar com seus semelhantes sem permissão da "nomenklatura" encastelada nos Comitês Centrais.
 
Em conseqüência, não é confiável. Necessita ser "desenvolvido" e integrado à massa, ou mesmo, conforme o caso, "justiçado" – como mais de uma vez já ocorreu no Brasil -, a fim de que o partido cumpra sua "missão histórica", pois, de acordo com a "doutrina científica", todos os aspectos do ser humano que não se prestem à sua politização são burgueses.
 
Durante os 70 anos em que, dialeticamente, o socialismo real nasceu, desenvolveu-se, cresceu e desapareceu, foram vários os dissidentes e contestadores, em todas as latitudes, da "doutrina científica". O mais conhecido, todavia, talvez tenha sido o iugoslavo Milovan Djilas, nascido em 1911, considerado um herege pelo mundo comunista do pós-Guerra. Após estudar Literatura e Direito na Universidade de Belgrado, filiou-se ao Partido Comunista e, em 1938, aos 27 anos, foi nomeado membro do Comitê Central do Partido Comunista (Liga Comunista Iugoslava) pelo então Secretário-Geral Josip Broz Tito, transformando-se em um dos seus mais fiéis assessores. Por alguns anos foi Ministro da Informação e Propaganda e vice-presidente da República.
 
Desempenhou várias missões políticas junto à União Soviética e foi considerado um dos responsáveis pelo rompimento de Tito com Moscou, após rejeitar, em 1948, todas as propostas e tentativas soviéticas de dominar a Iugoslávia, transformando-a em mais um satélite.
 
A partir daí, Djilas começou a demonstrar as evidências de uma profunda mudança ideológica. Desiludido com as propostas do stalinismo e com a própria linha política adotada pela Liga Comunista de seu país, defendeu, em uma seqüência de artigos publicados no jornal porta-voz da Liga, o "Borba", a tese de que os rumos da revolução deveriam ser revistos e de que naquele momento já se tornava necessária uma maior liberdade de opinião e um abrandamento do controle do partido sobre o Estado e sobre todo o povo. Em 1954, foi ainda mais longe, ao formular duras críticas ao modo de vida e à moralidade dos que se apoderaram do poder, não apenas na Liga, mas também na União Soviética e demais países da Europa Oriental.
 
Afastado de suas funções no governo e expulso da Liga, Milovan Djilas concedeu uma série de entrevistas a jornais estrangeiros, condenando o regime iugoslavo, o que o levou à prisão por três anos. Foi quando escreveu o seu mais importante livro, "A Nova Classe", que em 1967 foi editado no exterior. Esse livro é uma reflexão sobre os objetivos do stalinismo ao lutar para destruir a classe capitalista, supostamente exploradora, antevendo o surgimento de uma nova classe dirigente: a burocracia política, ou seja, a nomenklatura, como mais tarde ficaria conhecida.
 
Em razão desse livro, Djilas foi novamente condenado. Desta vez a sete anos de prisão, dos quais cumpriu a metade. Em 1962, voltaria ao cárcere, condenado por escrever o livro "Conversações com Stalin".
 
Nessa época, Djilas ainda acreditava que poderia permanecer sendo um comunista e, ao mesmo tempo, um homem livre. Finalmente, em 1970, escreveu "Além da Nova Classe", livro no qual defendeu a tese de que a ideologia comunista se encontrava em estado de deterioração e não mais era aceita como instrumento de organização de uma sociedade, nem mesmo pelos próprios comunistas.
 
Vinte anos depois, a queda do Muro de Berlim e o desmantelamento do socialismo real confirmariam essa previsão.
 
Milovan Djilas faleceu em 20 de abril de 1995. Um ano e meio antes de sua morte, escreveu uma série de três artigos, descrevendo os grandes momentos de sua vida e sua visão sobre o futuro do socialismo. A imprensa, em maio de 1995, publicou essa série de artigos. O último deles, "O Futuro do Socialismo Democrático", indiscutivelmente foi o mais importante.
 
Antes, porém, nos dois primeiros artigos, Milovan Djilas fez algumas revelações até então desconhecidas do grande público:
 
- que suas ideias a respeito do comunismo foram mais fruto de sua experiência própria, de seus problemas pessoais, da sua vivência, do que da simples contemplação filosófica;
 
- que era um crente, pois acreditava fielmente no comunismo. E somente um crente pode tornar-se um herege;
 
- que criticou o regime iugoslavo por sua conduta ambígua em relação à revolução húngara de 1956, embora Tito tivesse apoiado a intervenção soviética na Hungria.
 
Que do alto dos seus 82 anos - 18 meses antes de sua morte -, recordava-se de quatro momentos cruciais em seu desenvolvimento intelectual: sua transformação de intelectual rebelde em militante comunista; a compreensão de que, após a II Guerra, a Liga Comunista Iugoslava adotara uma orientação bolchevique e stalinista; a de suas longas prisões como comunista, quando teve oportunidade de voltar às suas leituras filosóficas; e a quarta e última fase, que foi a da intuição, que depois se transformou em experiência pessoal.
 
Somente em 1989, quando o desmoronamento do socialismo já era um fato na Europa Oriental, foi autorizada em seu país a edição de seus 14 livros.
 
Em "O Futuro do Socialismo Democrático", Milovan Djilas reconhece ter previsto o fim do socialismo, mas não a maneira como esse edifício iria desmoronar. Crê, entretanto, que o fim do socialismo real não tenha provocado seqüelas na social-democracia e nem na chamada "esquerda reformista". Se a social-democracia européia está em crise, disse ele, isso se deve à sua pouca adaptação à realidade do mundo atual e à sua identificação com o capitalismo neoliberal, pois a social-democracia, que hoje pode ser considerada a esquerda do capitalismo neoliberal, não elaborou idéias para reagir diante das mudanças que não cessam de ocorrer nas sociedades capitalistas.
 
Segundo Djilas, embora não saibamos qual deva ser a ideologia da social-democracia, jamais poderá ser o marxismo-leninismo, pois essa ideologia não tem qualquer validade para a construção da sociedade do futuro. Todavia, ainda considera válida a crítica ao capitalismo formulada por Marx, particularmente nos países que hoje empreendem um capitalismo tardio, como a ex-Iugoslávia e a Rússia, que até ontem eram comunistas. Esses países, hoje, percorrem o caminho pedregoso de transição do socialismo de Estado para o sistema de propriedade privada. Isso implica, necessariamente, diz Milovan Djilas, um período de capitalismo primitivo e, nesse contexto, é válido o método marxista, como o conhecimento histórico do capitalismo nascente e dos pactos sombrios dos seus primeiros passos.
 
As sociedades que surgiram das ruínas do socialismo, diante de um capitalismo primitivo e brutal, deverão lutar por programas sociais bem concebidos, com os olhos voltados para a criação de sociedades mais justas. Caso não consigam isso e prevaleçam os aspectos negativos do capitalismo primitivo, esses Estados conhecerão tragédias imensas, guerras e opressão.
 
As previsões de Djilas não ficaram longe da realidade. Na Rússia, as empresas de livre mercado, organizadas a partir de 1991, transformaram-se em reféns de grupos de criminosos organizados, conhecidos como a "máfia russa". Nesse sentido, funcionários do Ministério do Interior estimam que cerca de 40 mil empresas estão, de alguma forma, conectadas com organizações criminosas, e cerca de 10 dos 25 grandes bancos russos também têm conexões com a máfia. Os grupos criminosos também estão roubando e exportando materiais estratégicos das fábricas russas de armamentos. Empresas pequenas, tais como lojas de varejo, restaurantes e importadoras de bens de consumo, estão cada vez mais vulneráveis à extorsão.
 
Durante os primeiros anos da reforma econômica, gerentes e burocratas utilizaram-se ilegalmente do dinheiro e propriedades do extinto Partido Comunista e ativos do Estado para implantar bancos ou organizar empresas. Hoje, é difícil distinguir os verdadeiros empreendedores desses "sobreviventes soviéticos".
 
As sociedades socialistas, ao se esgotar a vitalidade da classe governante, transformada em uma burocracia parasitária, parecem não ter meios de atender às exigências de uma sociedade moderna.
 
Segundo Djilas, da mesma forma como estão sendo estruturadas as interações econômicas e políticas, irão nascendo as novas ideologias, como é o exemplo da União Européia. A nova ideologia será uma espécie de religião, caracterizada pela fé no ser humano e pelo propósito de melhorar as relações sociais num ambiente de justiça para todos. Djilas, no entanto, reconheceu que esse é um enfoque idealista, que precisará basear-se numa visão que supere a interpretação do capitalismo neoliberal, que prevê o atendimento dos interesses humanos apenas via lucro e eficiência econômica.
 
A futura ideologia da "esquerda reformista", por seu lado, não deverá representar obstáculo para as conquistas do capitalismo, como a eficiência e a rentabilidade das empresas. O problema central consistirá no modo de distribuir a riqueza sem prejudicar o bom andamento da economia e, simultaneamente, promover uma sociedade baseada em relações mais humanas e solidárias.
 
Esse idealismo, todavia, não deverá entregar-se à ilusão de tentar instituir uma sociedade com formas rígidas e permanentes. Sua finalidade será a criação de um novo modelo de relações sociais. Quanto mais diferenciada, melhor e mais criativa será a sociedade. Entretanto, o certo é que sempre existirão no mundo injustiças e desigualdades, reconheceu Milovan Djilas.
 
Em, 1948, separando-se da ordem stalinista, motivado por Milovan Djilas, Josip Broz Tito inaugurou um novo gênero na história do comunismo: o cisma do comunismo nacional. O conflito foi originado pelas tentativas de Stalin de infiltrar não apenas o partido iugoslavo, mas também o exército, a administração e os serviços de segurança. Tito recusou-se e assumiu os riscos de uma ruptura, dando inicio a uma nova fase do comunismo. Tito teria muitos imitadores, de tal forma que o discurso anti-soviético em linguagem soviética passou a constituir um gênero no repertório comunista. Ele não deixara de ser comunista, mas prezava a independência de seu país.
 
Mao-Tsetung seria o mais célebre dos contestadores da ortodoxia do marxismo-leninismo, mas não o único, pois até a minúscula Albânia de Enver Hodja, o país mais atrasado da Europa, se ergueria contra Moscou nos anos seguintes.
 
Mais recentemente, após o desmonte do socialismo, Nicolas Buenaventura, engenheiro e professor, que hipotecou sua vida ao comunismo, pois durante 40 anos foi membro do Comitê Central do Partido Comunista Colombiano, com o cargo de chefe da Seção de Educação de Massas também explorou a fundo, numa autocrítica ácida, constante de seu livro "Que Pasó, Camarada?", o que, segundo ele, foram as razões da catástrofe dos "socialismos reais".
 
Diz ele que os comunistas sempre lutaram por um pedaço dessa democracia formal e burguesa. Sempre defenderam, até a morte, a sua minguada liberdade de palavra, de imprensa, de dissidência e de oposição. A liberdade de locomoção, de ir e vir, de empresa - das empresas do partido -, dos camaradas, das associações, dos sindicatos. "Cada resquício de democracia tradicional, formal, era sagrado para nós".
 
"Defendíamos o pedaço de pão velho", como diria Bertolt Brecht. Porém, isso nunca foi considerado suficiente. Esse não era o objetivo. Era o meio. "Buscávamos a democracia total e real. Queríamos o pão inteiro".
 
Certamente, "defendíamos a democracia possível. Porém, quando chegasse o momento e tudo mudasse, chegaria a hora da democracia real".
 
Onde estava, então, o nosso erro? Qual foi o nosso pecado?
 
A verdade é que sempre fizemos uma leitura muito óbvia, muito simples, da história da "democracia formal".
 
Sempre raciocinamos assim: uma democracia sem pão, sem escola, sem terra, puramente formal, é mentirosa.
 
E daí em diante, dessa leitura simplista, vinha o resto, a grande dedução: primeiro o pão, primeiro a roupa, primeiro a terra e a escola e, depois, só depois...viria a democracia.
 
Era assim que nós encarávamos as coisas: sem pão, a democracia é uma mentira. Sem teto, sem escola, sem o conhecimento, é mentirosa a democracia. De forma que tudo tem o seu tempo, como diz a Santa Bíblia. Por agora, a saúde e a educação gratuitas. Depois, só depois, a democracia.
 
Nunca dissemos isso assim, explicitamente, na Colômbia, em Cuba ou na União Soviética. Nunca dissemos isso com estas palavras precisas.
 
Essa, porém, era a essência da nossa "democracia real". E era, por outro lado, a que melhor se adaptava ao mundo do subdesenvolvimento, sem maior cultura política ou tradição democrática. A esse mundo onde foi implantado e existiu o "socialismo real".
 
Então, para essa viagem desde o pão à "democracia do futuro" - uma viagem difícil; uma viagem, ademais, sem calendário -, para esse percurso tão acidentado, um grupo de "escolhidos", um grupo formado pelos "melhores", entre os quais Nicolas Buenaventura se encontrava, foi encarregado da direção. E esse grupo construiu o instrumento que conduziria os oprimidos à "Terra Prometida". Esse instrumento denominava-se "o Partido", assim, com inicial maiúscula.
 
Não se tratava de falar, de protestar ou de fazer oposição. Para isso havia sua hora, o seu tempo. Tratava-se de construir a "democracia real".
 
Depois, as coisas aconteceram como já sabemos. É um fato e uma verdade. Primeiro faltou a democracia, faltou a dissidência, faltou a oposição, faltou a minoria. Todos eram maioria. Uma maioria ideal, plena, uniforme, de uma só cor, que pouco a pouco foi se convertendo em unanimidade. Porém, o pão se acabou, veio a queda de produção, a ineficiência e a obsolescência.
 
Primeiro, o Partido foi roubado na democracia. Depois também no pão.
 
Dessa forma, nós aprendemos muito duramente, para sempre, esta lição: a democracia não tem ordem, não tem espera, não tem comissários políticos, nem delegação e nem guardiões. A democracia somos cada um de nós. É você mesmo.
 
E mais: a democracia é, certamente, o governo da maioria. Mas, de qual maioria?
 
De uma maioria que eu não chamaria simplesmente de respeitosa ou tolerante para com as minorias. Porque essas palavras têm, para mim, um sentido de autoritarismo.
 
De uma maioria enamorada das minorias, interessada nas minorias, por duas razões. Uma, porque toda maioria é múltipla. É composta por minorias concertadas. Outra, porque a minoria de hoje, como é óbvio, é a maioria de amanhã, já que o novo sempre surge e se anuncia muito pequeno, como uma semente.
 
A democracia é, justamente, o contrário de tudo que nós fazíamos no Partido e no Estado. O contrário da famosa pirâmide denominada "centralismo democrático", no qual as bases elegem os dirigentes intermediários e mantêm ligações com eles, que, por sua vez, elegem os dirigentes superiores e mantêm ligações com eles. Isso é realizado de tal forma que a linha de mandato e de contato entre a base e a cúpula, entre o povo e o verdadeiro governo, o de cima, é interrompida ou perdida.
 
Democracia é o contrário dessa pirâmide centralista ideal na qual a cúpula, isolada das bases, era sempre endeusada, convertendo-se em uma dinastia.
 
Democracia é descentralizar. É ir desamarrando por dentro, cada vez mais, o Partido e o Estado. É participar: que todos os organismos de Poder, desde os mais imediatos até os mais elevados, no Partido e no Estado, sejam eleitos diretamente pelos associados individuais.
 
Em uma palavra: democracia é cada vez menos governo do Partido e do Estado, e mais autogoverno da sociedade civil.
 
E, paralelamente, com isso e junto com isso, estará o problema do pão, da escola, da terra e do Direito.
 
Nós, do Partido Comunista, havíamos tapado, afogado, o pensamento de Marx, o pensamento da ilustração, com a tradução de um montão de manuais de marxismo-leninismo.
 
Nós vivemos sempre em um partido que não fez outra coisa, durante mais de meio século, senão instalar-se na porta da revolução, convencido, com a maior certeza, de que esse era o seu lugar, acabando por receber, por isso, o castigo mais duro.
 
Todas as revoluções neste século, em qualquer parte do mundo - e as revoluções são muito de invenção e riqueza -, utilizaram a violência para moer a antiga máquina, para quebrar o poder militar entrincheirado no capital. Tudo era uma grande festa.
 
Porém, mesmo após cumprir o seu papel demolidor, rompendo as antigas cadeias, mesmo após forçar as portas dos cárceres, a violência não cessava, não se detinha e começava a institucionalizar-se.
 
Eu vivi isso muitas vezes, na Nicarágua, na China e em Cuba.  Experimentei o "Poder local" guerrilheiro e vivi o poder opressor e absolutamente arbitrário dos donos do "novo Poder".  E tudo me parecia lógico. O novo dia, após anos de obscuridade, surgiria enredado em fios invisíveis de medo à cidade, ao povo, à vereda, ao camarada, ao guerrilheiro, ao dirigente. O "novo Poder" não se equivoca. Ele conhece os traidores, os colaboradores, os cúmplices passivos, os que nunca fizeram nada, os que não moveram um dedo. Ele conhece a todos.
 
Esse, todavia, não foi o problema, pois essa dinâmica é própria de todas as revoluções. Essa violência que cumpre seu papel libertário logo se aposenta, cedendo lugar ao "novo Estado de Direito". Isso não foi o mais grave no nosso caso, na história do socialismo real. O grande problema nunca foi, entre nós, a violência revolucionária e criadora, que se prolongou, quase sempre, além do seu tempo.
 
O grande problema, o verdadeiro problema, o problema real e profundo, teve lugar mais adiante e foi de outra natureza. Trata-se do esquema do "socialismo real". Esta segunda violência, a do esquema sacralizado, a do esquema que converte um possível processo histórico, uma hipótese de trabalho a verificar, em lei, norma e sentença. Essa "racionalidade" seca e fria, inaugurada pelo stalinismo, gerou inflexivelmente uma nova violência, que matou metodicamente todas as primaveras revolucionárias e aguou todas as grandes festas do nosso século.
 
E agora, eu me pergunto, depois de todo esse cataclismo: quando, em que momento, por que, nos convertemos a essa idéia, à idéia desse socialismo de bruxos, desse socialismo que deveria desmantelar o capitalismo como uma alternativa violenta, inevitável? Quando se atravessou em nosso caminho essa idéia tão fácil do Estado todo-poderoso, proprietário único, com todo o poder ao ombro, como se fosse um fuzil? Quando e como se impôs entre nós o mito do Estado como panacéia e a estadolatria? Esse mito, que primeiro foi um crime e em seguida simplesmente um vazio, quando se transformou em miséria sacralizada e repartida?
 
Foi esse o depoimento de Nicolas Buenaventura, que um dia foi um dirigente comunista.
 
A propósito: certa vez, um matemático disse que a Álgebra é a ciência dos preguiçosos. Não se conhece o valor de X, mas opera-se com ele como se fosse conhecido. No caso dos partidos comunistas, X representa as massas anônimas. E a política do partido sempre operou com esse X, por mais de 70 anos, sem a preocupação de conhecer a sua natureza real.
 
Uma grande parte dos comunistas permanece voltada para a tentativa desesperada de administrar a nova situação produzida pelo desmonte da "doutrina científica" antes que ela se evapore definitivamente de seus corações e mentes. Isso não tem sido fácil, pois desde a queda do Muro de Berlim, em 9 de novembro de 1989, e do fim da União Soviética, na noite do Natal de 1991, os antigos dogmas, tidos como verdades científicas, permanecem estratificados. Esse é, hoje, o X do problema algébrico.
 
Na década de 90, logo após o desmantelamento do socialismo real, em um muro, em Quito, Equador, poderia ser lida a seguinte frase, escrita pelos comunistas: "Ahora, que teníamos todas las respuestas, se cambiaram las preguntas".
 
A partir de então, um sem número de defensores da causa, em todos os países, entregam-se a uma autocrítica devastadora, chegando invariavelmente a uma mesma conclusão desoladora: os que progrediram no partido da classe operária foram os burocratas, os secretários, os maiores culpados pelo desmantelamento do socialismo real.
 
Onde quer que existisse um partido comunista, o modesto burocrata sempre observou, desde a sua mesa, quase com admiração, como chegavam à sede do partido os revolucionários, os heróis da agitação social, que imediatamente eram recebidos pelos chefes. O agitador, o brilhante lutador, apenas notava o burocrata porque fora convencido de que ele era a alma da burocracia partidária.
 
Passam-se os anos. O herói revolucionário, o agitador de massas, líder nas greves, nas passeatas, nas colagens de cartazes e nas pichações, na distribuição de panfletos e outras tarefas menos nobres, continuava indo à sede do partido. Algumas vezes até para ser repreendido e fazer uma autocrítica. O burocrata, no entanto, prosseguia ali, impassível, porém já em uma mesa maior. Antes manejava uma velha máquina de escrever expropriada pelo revolucionário, brilhante lutador. Agora, na era da informática, passava as idéias e decisões do partido diretamente ao computador. Continuava, no entanto, obsequioso e admirador do ativista.
 
Passam-se mais alguns anos. O agitador tem orgulho de seu passado glorioso, das prisões e perseguições que sofrera; da clandestinidade, longe da família e dos amigos, e das eventuais vitórias revolucionárias. É uma legenda, respeitado e admirado dentro do partido.
 
Em suas idas ao Comitê Central, é recebido por aquele mesmo funcionário. Porém, com o passar do tempo, já algo mais que um simples burocrata: fora elevado, por cooptação, ao cargo de Secretário de Agitação e Propaganda (Agitprop, na terminologia partidária) ou Secretário de Organização, com poderes, portanto, para remover o agitador, o brilhante ativista, antes admirado, de um lugar para outro. Já, então, o burocrata encara o velho lutador de forma diferente, pois agora lhe dá ordens, e o famoso princípio do "centralismo democrático" faz com que essas ordens sejam cumpridas.
 
Posteriormente, passados mais alguns anos, o lutador, o ativista, comprova que o Secretário passou a integrar o Comitê Central, substituindo um companheiro falecido. E que, assim, tornou-se membro da privilegiada nomenklatura partidária, passando a ter direito a passagens aéreas, férias anuais na Criméia e a matricular seus filhos na Universidade de Amizade dos Povos Patrice Lumumba, na Escola de Ballet de Leningrado e em outras.
 
O que se passou? Nada. Apenas o tempo.
 
O ativista, brilhante lutador, conserva seu passado, porém já não é útil, pois está "queimado", seja por ter se tornado excessivamente conhecido da polícia, seja por ter cometido alguns erros, seja porque militantes mais jovens já murmuram contra seus antiquados e ultrapassados métodos de trabalho. Protestará, e então lhe recordarão, como se fosse um membro da juventude partidária, que o partido da classe operária possui um Estatuto que exige disciplina férrea e que, mais uma vez, deverá fazer uma autocrítica.
 
Ao fazê-lo, a que conclusão chegará? Que sua vida política já está - como o partido e a própria doutrina -, no descenso da derrota, pois sonhou ser um chefe e não passou de um "quadro"; sonhou tornar-se um teórico doutrinador e limitou-se, em toda a sua vida, a assimilar as palavras-de-ordem alheias, nas quais, hoje, ninguém mais acredita.
 
Agora, resta ao velho lutador, ao agitador, ao herói revolucionário, curar as cicatrizes e desilusões, voltar ao início do século e, como Lenin, indagar: o que fazer? Enquanto não encontra uma resposta, engaja-se, como tantos outros, no esporte da moda: atirar pedras nos patriotas que impediram que a Pátria fosse transformada em um pleonasmo: uma "democracia popular."
 
O caso de Alexander Soljenitzyn foi diferente. Tão logo foi expulso da União Soviética, teve início, no Ocidente, uma campanha contra ele desenvolvida pelos expoentes da esquerda festiva que não conhecem o socialismo, pois não viveram sob ele. Para essas pessoas, Soljenitzyn passou a representar um problema, pois insistia em basear sua rejeição ao comunismo em duas proposições morais: a de que um sistema que se baseia na eliminação total da liberdade humana e na destruição sistemática de todos os valores individuais é mau; e a de que tratar amistosamente esse sistema significa trair os que sofriam sob seu jugo.
 
A imponente grandeza moral de Soljenitzyn e homens como Andrei Sakharov, Vladimir Bukovsky, Piotr Grigorenko e tantos outros, incomodava, daí a necessidade de desacreditá-los, pois não era fácil a nenhuma sociedade conviver com essas pessoas que, pela suas próprias existências conferem valor moral ao mundo em que vivem, inspirando milhões dentro e fora daquele mundo, que, temeroso de matá-los ou de deixá-los viver, acabou por expulsá-los.
 
Jamais a militância política nos partidos da esquerda revolucionária poderá ser a mesma do passado: a militância arquitetada pelo Partido Bolchevique. A impressionante explosão dos meios de comunicação de massa modificou profundamente os padrões de sociabilidade, diminuindo o peso das ruas, das assembléias, das passeatas, dificultando a mobilização das chamadas massas, acrescido que a atual caminhada, sem volta, para a globalização da economia, ao invés de concentrar trabalhadores, dispersa-os em unidades produtivas, mantendo-os mais preocupados com seus interesses espontâneos imediatos.
 
Até o início da década de 70, pelo menos, os comunistas cultivavam a imagem do militante abnegado, totalmente dedicado à "causa", disciplinado, que colocava em segundo plano sua vida pessoal, quando não abria mão dela, em função de um ideal: a vitória da revolução que abriria caminho para a emancipação da humanidade.
 
O militante era, antes de tudo, o soldado de uma causa, o homem do partido, quase o "homem-novo" idealizado por Marx. Extremamente ideologizado, sempre dava razão ao partido, ou àquele que, no momento, o encarnasse: Lenin, Stalin, Mao, Prestes e tantos outros. O militante forjou-se no interior de partidos militarizados. Determinado, capaz de tudo suportar, de jogar todas as suas fichas na utopia futura, de sufocar a individualidade em nome de sua dissolução no universo do coletivo construído pelo partido.
 
Leszek Kolakovski, outro dissidente russo, foi mais contundente e prático, especificando o socialismo pelo que ele não é. O socialismo não é:
 
uma sociedade na qual é crime ser irmão, filho ou cônjuge de um criminoso;
 
uma sociedade na qual alguém possa ser infeliz porque diz o que pensa, e um outro possa estar feliz porque não diz o que pensa;
 
uma sociedade em que alguém possa estar melhor ainda porque não pensa nada sobre coisa alguma;
 
um Estado cujos soldados são sempre os primeiros a penetrar no território de um outro país;
 
um Estado em que qualquer um possa ser condenado sem julgamento;
 
um Estado em que qualquer cidadão é potencialmente suspeito de alguma coisa;
 
um Estado cujos dirigentes se nomeiam, eles próprios, aos seus cargos, e nomeiam seus parentes para outros cargos;
 
um Estado que não permite a seus cidadãos viajarem para o exterior;
 
um Estado cujos vizinhos amaldiçoam a geografia;
 
um Estado que produz excelentes armas e péssimos sapatos;
 
um Estado em que os advogados de defesa estão sempre de acordo com o promotor;
 
um Estado que dita aos pintores as regras de como pintar e outorga prêmios a autores que não sabem escrever;
 
uma Nação que oprime outras Nações;
 
uma Nação que é oprimida por uma noção;
 
um Estado que obriga todos os seus cidadãos a terem a mesma opinião sobre Filosofia, Política Externa, Economia, Literatura e Moral;
 
um Estado cujo governo define os direitos do cidadão, mas a cujos cidadãos é vedado definirem os direitos dos governos;
 
um Estado em que cada um é responsável por seus ancestrais;
 
um Estado que assina pactos com criminosos e comete crimes para adaptar sua ideologia a esses pactos;
 
um Estado que gostaria de ver o seu Ministro do Exterior determinar a opinião pública de toda a humanidade;
 
um Estado em que toda vontade dos cidadãos é conhecida por seus governantes antes deles formularem qualquer pergunta;
 
um Estado em que os filósofos e os poetas dizem a mesma coisa que os generais e ministros, sempre um pouco depois destes;
 
um Estado em que as plantas das cidades são segredos de Estado;
 
um Estado em que os resultados das eleições são sempre previstos com exatidão;
 
um Estado que detém o monopólio mundial do progresso e bem-estar;
 
um Estado em que qualquer cidadão ou qualquer grupo humano pode ser transplantado para outra área residencial, sem qualquer consulta;
 
um Estado que acredita ser o único em condições de salvar a humanidade;
 
um Estado que sabe que sempre tem razão;
 
um Estado que crê que nenhum outro possa resolver melhor nenhum dos problemas existentes;
 
um Estado que determina quem pode criticá-lo e como;
 
um Estado em que o governo pode, a cada dia, rejeitar o que afirmou na véspera, acreditando e fazendo crer aos seus cidadãos que nada mudou.
 
A verdade é que o novo militante pós-Guerra Fria, pós-"perestroika" e pós-"glasnost", pós- socialismo real, jamais será o mesmo, pois não mais seguirá cegamente seus líderes; espera que o partido imagine outros caminhos de mobilização, pois não mais poderá insistir, simplesmente, em "colocar as massas na rua" .
 
Definitivamente, os modelos de militância que marcaram os setores mais radicais da esquerda nos últimos 70 anos se esgotaram. Figuras como "o bolchevique, o agitador anarquista, o guerrilheiro urbano, o soldado-partido", não mais existirão, pois as regras que regulavam o funcionamento dos coletivos que constituíam essas figuras "jurássicas" foram derrubadas.
 
Uma dessas regras, a fundamental, era aquela em que a Rainha Vermelha, do livro "Alice no País das Maravilhas", bradava:
 
"Primeiro a sentença; depois o veredicto!!" .
 
 
Carlos I. S. Azambuja é Historiador.