Francisco Seixas da Costa
A impressiva imagem do derrube da estátua de Lenine, que figurava numa avenida de Kiev, está, compreensivelmente, a correr mundo. (A similitude com a queda da estátua de Sadam Hussein é inevitável, mas as diferenças são grandes). Trata-se de uma espécie de "bofetada" numa Rússia onde, diga-se de passagem, terão também já desaparecido muitas dessas relíquias da antiga URSS. O ato é uma marca clara de que há hoje duas Ucrânias, uma seguidista face a Moscovo, outra desejosa de aproveitar a "boleia" histórica de um mundo europeu que hoje funciona como miragem. Ou, para usar a expressão cínica de um amigo que há pouco me falava de Londres, "a Europa está a passar pelo "efeito Gorbachov": gostam mais dela fora do que dentro". A crise ucraniana é muito complexa, mas tem de ser resolvida na própria Ucrânia, só podendo nós esperar que o venha a ser de uma forma pacífica e com uma resultante final democrática. Lembro-me bem que, nos anos 60, Adriano Moreira nos falava muito nas "zonas de confluência de poderes". Referia-se então às áreas geopolíticas da Guerra Fria onde o braço-de-ferro entre os Estados Unidos e a URSS prosseguia, muitas vezes quase à revelia das vontades nacionais. Essa Guerra Fria acabou, mas muito do que ela gerou está ainda por resolver. Mas não deixa de ser quase uma ironia que Ialta, onde o mundo foi dividido entre a Rússia e o ocidente no termo da Segunda Guerra mundial, seja uma cidade da Ucrânia. |
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