Domingos Amaral
Portugal está na típica "armadilha da dívida". Se cortar na despesa para fechar o deficit, causa recessão e desemprego, e a dívida pode aumentar porque o PIB cai. Se estimular a economia, com descidas de impostos, agrava o deficit e a dívida pode aumentar. Ou seja, façamos o que fizermos, há sempre algum objectivo que falha. Ou falha o deficit, ou falha o crescimento, ou falha a dívida. É a "armadilha da dívida" em todo o seu esplendor. Quanto mais pagamos, mais devemos. Como sair deste imbróglio? A "austeridade", tão do agrado de Passos, Gaspar ou Merkel, causou muitos danos, com um desemprego altíssimo e várias crises políticas. Com isso, ganhou-se alguma credibilidade, mas não se alterou a marcha imparável do crescimento da dívida. Agora, veio um pouco de crescimento económico, com mais turismo e exportações, mas também isso não impede os juros de subirem. Há um preconceito contra Portugal, como disse ontem Passos Coelho? O problema é mais profundo do que esse, infelizmente. Ao contrário do que muitos têm dito nos últimos anos, dentro do euro não há uma solução nacional para a questão das "dívidas soberanas". Nem Portugal, nem a Grécia, nem o Chipre, nem a Irlanda, têm capacidade para pagar sozinhos a monumental dívida que contraíram. Estão presos numa armadilha: emitiram dívida numa moeda que não controlam, e a desconfiança que sobre eles paira é permanente. Sozinhos, jamais sairão desta prisão. Desenganem-se os que pensam que a austeridade, as reformas estrurais, ou as exportações vão permitir o crescimento necessário para pagar estas dívidas. Não vão. Um segundo resgate, ou um programa cautelar, podem ser diferentes do ponto de vista político, mas não são muito diferentes do financeiro. É mais dinheiro emprestado, com muitas condições, seja pela "troika", seja pelo BCE. E não nos tira da armadilha. A única solução é europeia. Só a Europa, com os seus recursos, e a sua força política, poderá solucionar definitivamente a questão. Mutualizar a dívida é absorver a dívida dos prevaricadores; mas também é impedir que esses países, no futuro, se endividem mais. Porém, não parece ser esse o caminho da Sra. Merkel. A sua vitória de ontem foi retumbante, e histórica. Mas, não chega para governar sozinha. Mudará Merkel, aliada ao SPD ou aos Verdes; tornando-se mais europeia e menos alemã? Ou continuará a insistir numa receita que causa muitos danos e não resolve o problema da dívida? Portugal está no topo da preocupações de Merkel, diz hoje o Wall Street Journal, e pode despoletar mais uma crise do euro. É tudo verdade, mas Merkel, se quisesse, podia caminhar noutro sentido, menos duro e punitivo. As soluções nacionais, de sacrifício e "troikas", estão esgotadas. Não há soluções solitárias, só de conjunto. Talvez Passos tenha mesmo de ir lá falar com ela, pedir-lhe compreensão e ajuda. Mas só isso, é insuficiente. Mais Europa, é o que é preciso. Caso contrário, irá prolongar-se este ciclo de agonias, com pequenos interlúdios de alívio, como foi este Verão.
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