Domingos Amaral
E, de repente, o partido que sempre disse que iria "além da troika", nas reformas e nas políticas, desata a atacar o FMI! É verdade: o PSD, em palavras ditas pelo seu porta-voz e vice-presidente, Marco António Costa, defendeu que é preciso "combater a hipocrisia institucional do FMI, que faz proclamações muito piedosas, mas depois revela uma atitude inflexível nas negociações"! Traduzindo por miúdos, para que todos entendam: o PSD acha que é lamentável e hipócrita o FMI publicar relatórios e documentos onde constata que "as políticas de austeridade foram um erro"; e que "é preciso ir mais devagar no corte nas despesas"; e depois, quando vem a Portugal, como membro da "troika", obriga a medidas cada vez mais duras e não mostra um pingo de flexibilidade nas metas do deficit. Há aqui várias coisas importantes para notar. A primeira é que o PSD, partido que sustenta o Governo, foi o grande defensor da necessidade da "troika" vir para Portugal. Antes das eleições, muitos no PSD exigiam o "resgate internacional" e a "vinda do FMI", julgando eles que o resgate seria um poço de virtudes. Por calculismo político, para derrotar Sócrates; e por crença ideológica na "diminuição do Estado", o PSD tornou-se o grande aliado da "troika" e do FMI. Disse mesmo que "iria para além da troika", o que se revelou verdadeiro e ao mesmo tempo desastroso. Em segundo lugar, é preciso relembrar que, ao longo de quase três anos, o PSD e o Governo nunca defenderam mais "flexibilidade", e Passos chegou mesmo a dizer, orgulhosamente, que Portugal não precisava nem de "mais tempo", nem de mais "dinheiro". No entanto, os resultados da austeridade foram terríveis, e os vários países a quem foi aplicada a receita das "troikas" afocinharam em recessões muito mais duras do que se previa. Aos poucos, Europa fora, todos foram percebendo que esta fórmula não estava a dar resultados, mas ninguém quis dizer isso muito alto, para não perder a face. Honra lhe seja feita, o FMI foi até agora a única instituição que, em vários documentos e relatórios, já reconheceu os graves erros das políticas de austeridade, seja na Grécia, seja em outros países como Portugal. Contudo, amarrado que está ao BCE e à Comissão Europeia, nas "troikas", e com muito dinheiro enterrado nesses países, o FMI não irá facilitar muito até ao final deste programa de resgate. É evidente que há uma certa hipocrisia em dizer que se está a fazer mal, e contudo continuar a fazê-lo. Mas, não haverá maior hipocrisia ainda no PSD, que sempre quis ir além "da troika" e agora se queixa dela? Este partido, cujo líder é primeiro-ministro há mais de dois anos, e que implementou com convicção todas as medidas, agora vem dizer que é preciso a "troika" mostrar "flexibilidade"? A verdade é que o PSD está preso no labirinto que criou para si próprio. Acreditou tanto na troika e na austeridade, que agora que as coisas falharam, tem de arranjar um inimigo novo. Dos ataques ao Tribunal Constitucional, por não deixar executar cortes na despesa, passamos aos ataques ao FMI, por não praticar o oposto, deixando a despesa crescer mais! Coitado do PSD, está esquizofrénico mas ainda não percebeu. |
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