Os contribuintes portugueses deveriam estar vermelhos de raiva e indignação. E deveriam porque têm sobejas razões para isso. Já todos estamos habituados às derrapagens nos custos das obras públicas, que depois são pagas através de mais impostos e todo o tipo de taxas que nos vêm buscar aos bolsos. Mas apesar de constatarmos, há muitos anos, situações deste tipo, continuamos todos à espera que as autoridades, não obstante a desfaçatez e pouca vergonha dos envolvidos, ponham um limite a estas derrapagens. Esperamos mal. Pelos vistos, estamos redondamente enganados. As últimas seis concessões de auto-estradas adjudicadas pela Estradas de Portugal apontavam para um custo total, segundo as estimativas iniciais do Governo, de €2790 milhões. A factura final, contudo, vai ficar em €3900 milhões. Ou seja, a módica derrapagem é de €1110 milhões, mais 39,7% que o inicialmente estimado! Valha-nos que o Tribunal de Contas (TC), dirigido por Guilherme de Oliveira Martins, recusou o visto a duas das concessões (Douro Interior e Transmontana), onde os custos cresceram 120 milhões e 177 milhões, respectivamente. E as outras quatro concessões (Baixo Tejo, Baixo Alentejo, Litoral Oeste e Algarve Litoral) aguardam o visto prévio do TC, pelo que podem vir a ter o mesmo destino. Contudo, a Estradas de Portugal vai recorrer. Ao fazê-lo, as obras podem continuar, embora não possa haver pagamentos. E como o tribunal vai demorar imenso tempo a decidir, quando a decisão for conhecida, mesmo que dê razão ao Tribunal de Contas, estaremos confrontados com um facto consumado: os novos troços de auto-estrada já concluídos ou quase, pelo que a sua suspensão será inviável - e, no caso contrário, o Estado terá de ressarcir os construtores pelo que já fizeram. Então, como é óbvio, mandará o bom senso que se decida que se concluam as obras, sob pena de a penalização para os contribuintes ser ainda maior: pagarem e não terem auto-estrada. E assim, mais uma vez, pagaremos o que não deveríamos pagar, não haverá responsáveis e tudo será considerado natural. Pois não é natural nem devemos conformar-nos com essa suposta naturalidade. A carga fiscal que pesa sobre todos nós é também resultado, em parte, deste tipo de situações. E estas parcerias público-privadas (PPP), sendo teoricamente uma boa ideia, têm vindo a constituir, na prática, um modelo muito desvantajoso para o Estado. As PPP realizadas, em curso ou projectadas (concessões rodoviárias e ferroviárias, construção de hospitais, aeroportos, tribunais e prisões e expansão das redes de metro de Lisboa e Porto) representam já encargos para todos os contribuintes da ordem dos 55 mil milhões, com elevada concentração temporal na próxima década (cálculos de Eduardo Catroga). Acresce que, da forma como as PPP têm funcionado, a maior parte dos benefícios fica do lado dos privados e todo ou quase todo o risco do lado dos contribuintes). E isso leva a que o sector empresarial privado e banca (nacional e estrangeira) apostem fortemente nestes projectos, de risco muito menor e ao abrigo da concorrência externa, em vez de o fazerem nos sectores dos bens e serviços transaccionáveis, ou seja, aqueles de que o país necessita como de pão para a boca para aumentar a sua competitividade externa. Está, pois, tudo errado na forma como funcionam as PPP e nos sinais que dão para os agentes económicos. E é inadmissível que não só não sirvam para melhorar a competitividade do país como contribuam para onerar a factura fiscal da actual e da próxima geração de contribuintes.
PQP chega a líder europeu
É um dos maiores investimentos industriais de sempre em Portugal. E torna o país líder europeu na produção de papéis finos de impressão e escrita não revestidos. Este feito é alcançado através da entrada em funcionamento da nova fábrica de papel do Grupo Portucel Soporcel, uma unidade que cria 350 novos postos de trabalho altamente qualificados e que representará 4% do total das exportações nacionais. É o tipo de investimento de que o país necessita desesperadamente, pois cria bens transaccionáveis de alto valor acrescentado e empregos de elevadas qualificações. Além do mais, a coragem de Pedro Queiroz Pereira investir €550 milhões nos tempos que correm é um enorme exemplo para todos os empresários. Não se chegou aqui por acaso. O então ministro da Economia, Augusto Mateus, apostou na integração da fileira do papel, através da fusão da Soporcel e Portucel. Contratou um gestor privado, Jorge Armindo, para a concretizar. E depois o Estado privatizou a empresa. Os resultados são a prova de que quando se sabe o que se quer, se define o objectivo e se encontram as pessoas para o concretizar, a probabilidade de êxito aumenta exponencialmente. Um exemplo para meditar. A Parque Escolar e o défice. Não há economista que se preze que não defenda que o investimento público prioritário deve incidir, por exemplo, na reparação do parque escolar. E assim o Governo criou a Parque Escolar, que vai modernizar mais de 300 escolas e que, para isso, conta com financiamentos do BEI, que podem atingir mil milhões. Na primeira fase, a modernização de 26 escolas custará 330 milhões, na segunda 75 escolas importarão em 840 milhões e na terceira cem escolas exigirão um investimento de 1200 milhões. Estarão envolvidos 50 a 80 subempreiteiros e serão criados 20 a 25 mil empregos directos e indirectos. Tudo certo, portanto? Infelizmente, não. Todo este processo passa a latere do Orçamento do Estado, quer o investimento (que não é contabilizado como investimento público), quer as responsabilidades relativas ao endividamento. Mas deviam, porque na prática este projecto deve estar reflectivo no OE ou na dívida pública. Não o fazer significa desorçamentar. E maquilhar mais ainda as contas públicas. O risco moral das empresas. A crise colocou sob os holofotes práticas empresariais que apareceram, em muitos casos, como injustas, imorais ou mesmo obscenas. Mas a história ensina-nos que, à onda de indignação popular que obrigou reguladores e governos a intervir, se seguirão tempos em que a lassidão de práticas voltará a ocorrer e os mesmos erros se repetirão. É sobre estes temas que João Talone reflecte num pequeno opúsculo com o título "O risco moral das organizações". Nele não se fazem acusações; escalpeliza-se o problema. Sublinha-se que existem comportamentos que não são éticos nem ilegais, mas que podem ser "justificados" pela defesa de "interesses superiores", dando origem a "riscos morais" que podem ter graves consequências para as organizações. Frisa-se que ao abrigo da Responsabilidade Social e Desenvolvimento Sustentável "têm sido praticados actos de puro nepotismo que mais não são que um 'Risco Moral' potencialmente grave". Sublinha-se que os líderes têm de adoptar uma conduta rigorosa e exigente, para poderem imprimir uma cultura de rigor ético nas organizações. Que não é a mesma coisa o carácter de independência de um administrador com um administrador independente. E muito mais. Um livrinho indispensável. 13 anos em cena é obra! Uma peça de teatro estar 13 anos em cena é obra! E se for teatro feito em Portugal por profissionais portugueses para o público português, esta longevidade é ainda mais extraordinária. A divertida peça chama-se "As Obras Completas de William Shakespeare em 97 minutos" e uma sessão especial no São Luiz, no dia 23, assinalará este aniversário, com o primeiro elenco (já teve cinco) que a representou: Simão Rubin, Manuel Mendes e João Carracedo. A estreia foi a 24 de Novembro de 1996 em Portimão. Quatro dias depois foi a vez de Lisboa. Desde aí, não mais parou. E continua em cena às terças e quartas no Teatro Estúdio Mário Viegas. Se ainda não viu, não perca. Se já viu, volte a ver. Vale a pena.
Você tem-me cavalgado,
seu safado!
Você tem-me cavalgado,
mas nem por isso me pôs
a pensar como você.Que uma coisa pensa o cavalo;
outra quem está a montá-lo.Alexandre O'Neill,
A História da Moral
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