Há pelo menos três décadas que os portugueses assistem à nomeação para os conselhos de administração de empresas públicas ou participadas pelo Estado de pessoas que, muitas vezes, não cumprem os mínimos requisitos para ocupar essas funções ou que são simplesmente capatazes políticos e correias de transmissão do poder. Há mais de trinta anos que os portugueses assistem à distribuição de lugares dependentes do Estado por uma amálgama de gestores, administradores e directores identificados com o centrão político. Há muito tempo, demasiado tempo que nos habituámos a aceitar como natural, que PS e PSD dividam entre si esses lugares, sem ter em conta que personalidades independentes os desempenhariam com muito mais eficácia e proveito para o país. E há muitos anos, demasiados anos, assistimos com indiferença à renovação deste ciclo, segundo estas regras não escritas mas aceites como uma fatalidade inelutável por todos.
Pois finalmente alguém faz alguma coisa para mudar a situação. O Fórum dos Administradores de Empresas, Deloitte, Egon Zhender International, Pedro Rebelo de Sousa e Associados e ISCTE/UNL apresentaram uma proposta, entregue ao Presidente da República e ao primeiro-ministro, que permite acabar de vez com esta situação. A proposta passa pela criação de um comissário para as nomeações públicas, independente do Governo e que deverá, em princípio, ser escolhido pelo Presidente da República. Tem como funções a avaliação dos potenciais candidatos a um determinado cargo, promovendo a discussão de outros nomes além dos propostos pelo Governo, de onde saia uma lista final com no máximo três nomes, que serão avaliados por um painel de entrevistadores. A decisão final caberá sempre ao ministro da respectiva tutela.
Sugere-se também que, a par da avaliação de desempenho da pessoa escolhida, venha também a ser instituído um processo semelhante de avaliação do funcionamento dos conselhos de administração das empresas públicas. Numa segunda fase, o modelo pode ser alargado a outras áreas da administração pública, nomeadamente à escolha dos directores-gerais.
A reflexão do grupo não se fica por aqui. Tendo em conta a insistência com que Bruxelas tem vindo a tentar acabar com as golden shares, propõe-se que o Estado defina a tempo e horas uma forma prioritária de intervenção dentro das modalidades golden share, holding de investimento público e/ou fundo soberano, que pode passar pela participação social com classes especiais de acções e/ou a existência de acordos parassociais com outros accionistas de referência. E que passa também por definir o que são sectores e investimentos estratégicos, que exijam um controlo de proximidade pelo estado.
Finalmente, é feita uma reflexão sobre a regulação económica, que deve ser independente do poder político, ter independência financeira e garantir as condições de independência dos administradores relativamente aos interesses que vão regular.
Digamos que há aqui um conjunto de princípios de enorme bom senso, para acabar de vez com a suspeição sobre as nomeações para cargos públicos. Veremos se este verdadeiro serviço cívico que a sociedade civil colocou à disposição dos nossos decisores políticos será utilizado ou deitado para o lixo.
Petróleo em português
O leitor sabe o que é o upstream na indústria petrolífera? A partir da semana passada, com o lançamento em Lisboa do "Dicionário do Petróleo em Língua Portuguesa", uma iniciativa conjunta da Petrobras, Sonangol, Partex Oil and Gas e IBP-Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis, a indústria, os académicos e os cientistas que falam português passam a dispor de uma obra que os ajuda a ultrapassar dificuldades na compreensão do jargão petrolífero anglo-saxónico. O dicionário, contudo, é muito mais do que a tradução de 9000 termos de difícil compreensão para o cidadão comum. Como escreve António Costa Silva, presidente da Partex, a obra funda "um novo espaço de comunicação ao nível científico e técnico, ao mesmo tempo que celebra a diversidade, a vibração e a dinâmica da língua portuguesa, sem esquecer o referencial e a regra".
Ah, upstream é a parte da indústria petrolífera que engloba todas as actividades que antecedem a exploração do petróleo ou gás, como a pesquisa exploratória, geologia de campo, levantamentos sísmicos preliminares, perfuração de poços, análise de amostras e qualificação do petróleo, delimitação do reservatório, etc. Ajuda, não é?
A lição da Novabase
Luís Paulo Salvado tem 43 anos e é presidente da Novabase. Chegou ao cargo a trabalhar muito e calejado por uma crise grave que a empresa atravessou. Nessa altura, em que a tecnológica, fundada por Rogério Carapuça, contratava 30 pessoas por mês, confrontou-se de repente com a necessidade de despedir 300 colaboradores. Fê-lo depois de explicar a todos os colaboradores que a situação da empresa não permitia outra solução. Em seguida, definiu aqueles que eram fundamentais. Falou com os outros, um a um, olhos nos olhos. E depois mandou os melhores sair do escritório e voltar a vender aos clientes. Isso permitiu à Novabase sair reforçada da tempestade que atravessou. É uma lição de gestão: dizer a verdade, chamar a si a responsabilidade das decisões difíceis, empenhar todos na solução. É assim que as equipas se fortalecem em torno dos seus líderes.
O salário não é obsceno...
Desde que António Mexia é presidente da EDP, a empresa tornou-se a maior do PSI-20, chegou ao terceiro lugar a nível mundial nas energias renováveis e está a desenvolver o maior programa de construção de barragens na Europa. Em 2009, Mexia ultrapassou todos os objectivos a que se propôs (e que foram aprovados pelos accionistas). Não é, por isso, surpreendente que tenha recebido muito dinheiro em salários e prémios (€3,1 milhões), embora possa ser chocante e mesmo obsceno, face à situação do país. Mas não foi Mexia que definiu as regras. Só beneficiou delas, particularmente do facto de, a partir de 2008, a empresa ter passado a estar dotada de duas comissões de vencimentos: uma que estipula o ordenado e os prémios do presidente do conselho de administração executivo e dos administradores; e outra que se debruça sobre os ordenados do conselho geral e outros órgãos sociais. É surpreendente que não baste uma comissão para fazer os dois trabalhos. E mais surpreendente é que possa haver orientações diferentes. Mas a verdade é que há. A segunda é poupadinha. A primeira é uma mãos largas. Nesta estão Alberto de Castro, Eduardo Catroga e Vasco de Mello. Na segunda estão José Manuel Galvão Telles, Plácido Pires e Carlos Veiga Anjos. Percebe-se tudo.
Há manifesto? Sou contra!
Decididamente, pegou a moda dos manifestos. Agora é um a exigir uma nova política energética - mas o que está debaixo de fogo é o apoio que o Estado tem dado às indústrias renováveis, em particular à eólica. Expliquemos: para lançar a indústria, o Estado garantiu aos investidores a compra de toda a energia produzida, a um preço compensador e claramente acima das outras formas de produzir megawatts. Faz sentido? Faz. Deu resultado? Deu. Resolve a nossa dependência energética? Não. Mas Portugal tornou-se em apenas cinco anos o terceiro maior produtor mundial de energias renováveis. É verdade que não nasceu uma indústria nacional de equipamentos à volta desta energia. Mas será suficiente para denegrir um indiscutível sucesso português, elogiado internacionalmente? Claro que devemos discutir tudo. Mas no manifesto lá vêm a cavalo a energia nuclear e os ressabiados do socratismo, a par de alguns inocentes úteis e os que também querem comer à mesa do orçamento. Tudo ideias e intenções velhíssimas. Nicolau Santos - Expresso
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