Cenas dos últimos capítulos. Pedro Marques Lopes escreveu um texto intitulado "Os mártires da opinião" onde se queixava da trupe dos colunistas irresponsáveis. Eu desconfiei que era um dos que encaixava naquela sua categoria e escrevi o texto "O barrete de Pedro Marques Lopes" onde me queixava da trupe dos colunistas que cultivam o "respeitinho". Pedro Marques Lopes respondeu com o texto "João Miguel Tavares, o amedrontado", onde achava que eu acho que posso "achar tudo" o que me "vem à cabeça e torná-lo público". E Ferreira Fernandes juntou-se ao tête-à-tête para explicar que "o jornalista João Miguel Tavares" escreve como se estivesse a ser perseguido - e não está. E é verdade: não estou. Mas, em primeiro lugar, não foi o jornalista João Miguel Tavares que escreveu aquele texto. Eu sou jornalista, de facto, mas não no DN. No DN sou colunista. E por isso convém não confundir um texto de opinião com uma notícia quando se está a discutir a liberdade de expressão. Em segundo lugar, se o que Ferreira Fernandes quer sublinhar é que Portugal não é a Argélia, e por isso convém ter cuidado com o uso da expressão "sociedade amedrontada", eu dou-lhe isso de barato. Portugal não é, de facto, a Argélia. O Portugal de 2009 não é o Portugal de 1969. E, se quisermos recuar até às origens do mundo, antes a nossa liberdade de expressão que a de Adão, que mal abriu a boca foi expulso do Paraíso, sem direito a contraditório. Isso não significa, contudo, que a nossa sociedade tenha uma cultura de efectiva liberdade, como o jornalista Ferreira Fernandes bem sabe. Do mais obscuro assessor ao ilustre procurador-geral da República, a cultura do esconde-esconde é transversal ao aparelho do Estado e a todas as instituições do regime. E isto não é uma opinião - é uma evidência que qualquer jornalista pode testemunhar. Quer isso dizer que é preciso uma coragem desmedida para opinar em Portugal? Não, não quer. E sou testemunha disso mesmo. Eu comecei a escrever uma coluna no DN em Julho de 2003, e desde então tenho distribuído todas as semanas as minhas opiniões pelas páginas deste jornal - ou, como diria Marques Lopes, "achei" sobre tudo e mais alguma coisa. Tive como directores Mário Bettencourt Resendes, Fernando Lima, Miguel Coutinho, António José Teixeira e João Marcelino, e nenhum deles jamais fez qualquer observação sobre aquilo que escrevi. Nesse aspecto, o DN sempre foi, para mim, um espaço exemplar de liberdade. Não sou dado a nostalgias, mas no momento em que, ao fim de seis anos e meio, termina a minha colaboração com este jornal, gostava que isso ficasse bem claro. Sou um privilegiado num país em que muitos não têm a mesma sorte do que eu. A liberdade não se agradece. Terem-me lido, sim. Muito obrigado. João Miguel Tavares - DN
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