Na sexta-feira, gravei na RTP Informação uma conversa com o jornalista Manuel Menezes, no seu programa "Olhar o Mundo" (*). Durante 20 minutos, falámos da Europa que temos, do lugar de Portugal nela, de crise do euro e dos desafios da atual diversidade europeia. No momento da gravação, os números do compromisso financeiro obtido no Conselho europeu da véspera ainda não eram muito claros. Agora já o são.
Sobre o assunto, sublinhei o que considerei ser uma forte incoerência da política orçamental da União face ao caso português. Com efeito, num momento em que duas instituições comunitárias (o BCE e a Comissão Europeia) estão comprometidas com o processo de ajustamento português, é verdadeiramente chocante ver aprovado um orçamento, para sete anos, desenhado como se estivessemos num tempo normal, sem se entender que, perante os elevados constrangimentos orçamentais nacionais, um esforço específico deveria ser feito ao nível do reforço dos fundos comunitários para os países sob assistência, elemento essencial para o investimento público. Esse esforço de coerência deveria ter sido realizado pela Comissão Europeia e não o foi. O (antigo) "executivo" de Bruxelas mostrou aqui toda a sua flagrante irrelevância atual no processo comunitário. Espero que o Parlamento europeu não esqueça isto, no debate que agora se seguirá.
Mas voltemos às "perspetivas financeiras". Devo começar por dizer que me impressionou a forma ligeira, muito ao modo do país de "prós e contras" que por aí anda, como a generalidade dos comentadores televisivos dessa noite de sexta-feira analisou resultado de Bruxelas. Salvo uma ou duas exceções, as pessoas ouvidas optaram por um registo de seguidismo face à leitura oficial do resultado ou de mera oposição não fundamentada, face à importância daquilo que Portugal obteve. Os "situacionistas" deliciaram-se em laudas às vantagens obtidas na PAC (e para a CAP) para o "desenvolvimento rural" e o "reviralho" passou o tempo a atacar a falta de "ambição" europeia, assim fazendo forte oposição... a Bruxelas.
Ora, à luz de alguma experiência que julgo ter neste domínio, entendo que não é muito difícil chegar a uma conclusão sobre se Portugal saiu ou não beneficiado deste exercício. Para tal, deixo algumas pistas sobre a forma como se devem ler os resultados.
Sendo uma evidência incontestável, o facto do orçamento global ter, pela primeira vez, diminuído, e isso representar uma falta de vontade dos "vinte e sete" para reforçar o projeto europeu, é relativamente indiferente na análise do resultado português. Como também o é a circunstância de se poder arguir com a ideia de que as coisas acabaram por ser um pouco melhores do que aquilo que era a proposta original: todos sabemos que é sempre assim... Finalmente, e do mesmo modo, o volume global de recursos que foram alocados a Portugal, com os "envelopes" laterais que sempre fazem parte destes exercícios, sendo um dado concreto a ter em conta, acaba por ser menos relevante para a análise que importa fazer - isto é, saber se Portugal ganhou ou perdeu nesta negociação. Como se pode chegar então a essa conclusão?
Julgo que é relativamente simples. Registe-se a percentagem que o volume de recursos obtidos por Portugal no anterior quadro financeiro representava no total do orçamento plurianual 2007-2013. Faça-se, depois o saldo final deste recente exercício, à luz do mesmo critério, descontado o efeito do futuro alargamento à Croácia. E compare-se. Como alguém dizia: é fazer as contas...
* Pode ver o programa aqui
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