Acabei de escrever há pouco o prefácio para um interessante livro do professor Janela Antunes sobre a vida política portuguesa entre 1974 e 1976. É um trabalho que desejo que seja publicado em breve, porque nele muito se aprende sobre esse tempo agitado de mudança de paradigma na vida política portuguesa. O texto é acompanhado por uma riquíssima e inédita seleção de documentos diplomáticos franceses da época, que têm a curiosidade de nos pôr a ver a nossa realidade sob os olhos do Quai d'Orsay.
Um dos focos importantes do livro e da documentação que o acompanham é a ação do Partido Comunista Português. E dei por mim a pensar que foi uma delegação do PCP a primeira a visitar-me, após a minha chegada a Paris.
Nunca tive qualquer relação política pessoal com o PCP, partido onde tive e tenho vários amigos. De há muito que conservo um grande respeito pela indiscutível coragem dos comunistas portugueses na luta contra a ditadura do Estado Novo. Como muitos oposicionistas, estive, com grande gosto, ao lado deles nas "batalhas" da CDE de 1969 e, frequentemente, na luta associativa académica antes do 25 de abril.
No período subsequente ao 25 de abril, tive fortes divergências com certo tipo de atitudes e opções que o PCP tomou, nomeadamente no âmbito da política militar de então. A leitura do livro do professor Janela Antunes ajudou-me, aliás, a perceber melhor o fundo dessas divergências.
Desde então, a minha relação institucional com o PCP pautou-se sempre por uma atitude de grande respeito democrático, que, na minha perspetiva, tem de estar sempre para além das opções políticas. Tive o privilégio de ter estabelecido um relação muito cordial com figuras do PCP já desaparecidas como João Amaral, Luís Sá ou Joaquim Miranda. E recordo a supresa de Jerónimo de Sousa, o atual secretário-geral, quando, como embaixador de Portugal no Brasil, o fui cumprimentar no início de uma conferência que proferiu numa instituição do Rio de Janeiro, gesto que não me parece que seja muito comum na diplomacia portuguesa. Os comunistas, podendo cometer erros como qualquer força política, não "comem criancinhas ao pequeno almoço" e a democracia portuguesa tem tudo a ganhar em tratar com consideração e equanimidade democrática o PCP.
Mas voltemos à visita que a delegação do PCP me fez, nesse mês de março de 2009. Eram três elementos e, durante quase uma hora, mantivémos uma agradável conversa, em particular sobre a vivência política no seio da diáspora portuguesa em França. No final, um dos integrantes da missão comunista congratulou-se com o facto do pedido de audiência ter sido concedido com grande rapidez, decorridos muito poucos dias após ter sido formulado.
Com um sorriso, esclareci-os: "Eu quis que esta conversa tivesse ligar na data de hoje, que sei que ela lhes é muito grata..". Olharam uns para os outros e, nesse momento, deram-se conta que estávamos em 11 de março, data que os comunistas portugueses intimamente comemoraram como sendo a das grandes nacionalizações de 1975...
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