domingo, 30 de agosto de 2009

Watergate à portuguesa

A história começou com uma acusação: os assessores do Presidente andavam a ajudar a escrever o programa do PSD. Uns dias depois, um 'garganta funda' de Belém fez as perguntas que faltavam ao "Público": "Como é que os dirigentes do PS sabem o que fazem ou não fazem os assessores do Presidente? Estamos sob escuta ou há alguém na Presidência a passar informações?" Primeiro resultado da notícia: a fonte confirma a acusação feita pelo PS. Faltava responder à inquietação: como raio souberam os dirigentes do PS de um segredo que apenas tinha sido publicado há 15 dias no "Semanário" e seguidamente difundido no site de Manuela Ferreira Leite? Como estaria esta gente tão bem informada? Leriam jornais? Consultariam a Internet? A dúvida, a ansiedade, a consternação...

Depois de o "Público" ver morto, em poucas horas, o seu pequeno Watergate, decidiu não desistir. No dia seguinte, o problema já não eram as escutas aos assessores. Há um ano meio (há jornais que gostam de notícias frescas) um suspeito assessor de Sócrates acompanhou a comitiva do Presidente à Madeira. O espião escreve em blogues, foi autarca e é autor de um livro contra Cavaco Silva. O homem certo para não dar nas vistas. Diz que almoçou sem ser convidado e, veja-se lá, até conversou com jornalistas do continente. Sempre atentos, os senhores da Casa Civil viram ali todos os sinais da presença do agente 001 da polícia socratista.

A acusação de escutas e vigilância à Presidência, apesar de patética, é, se este país ainda se leva a sério, gravíssima. Perante ela, seria de esperar uma de duas atitudes do Presidente: ou confirmava a suspeita e agia em conformidade ou a desmentia e corria com o assessor que anda a espalhar tamanhos disparates. Nem uma nem outra. Preferiu, com o silêncio, alimentar a coisa. E é nestes pormenores que se percebe como há homens desajustados à relevância do lugar que ocupam.

A solidão de Portas

Há quatro anos Paulo Portas abandonou a liderança do CDS porque ficou poucos votos à frente de "trostsquistas e comunistas". Dois anos depois, no meio de gritos e encontrões, Ribeiro e Castro foi corrido sem ter sequer chegado às urnas. Portas voltou e, nas últimas europeias, depois de ter ficado atrás dos mesmos "trotsquistas e comunistas", festejou com lágrimas. Porquê? Porque teve mais do que as sondagens anunciavam. E esta é a arte de Portas: cria narrativas improváveis.

Como um eucalipto, Portas foi aniquilando todos os quadros do seu partido. Primeiro os opositores, depois aliados e amigos. O pouco que restava de apresentável foi enviado para Bruxelas. É da sua natureza: Portas é a sua própria solidão. E fez do CDS o primeiro partido português verdadeiramente unipessoal. Sozinho, tem de encarnar todas as personagens da direita: o "Paulinho das feiras e da lavoura", o "ministro de Estado", o político "contra o rendimento mínimo, os imigrantes e os criminosos", o Portas "conservador e cristão", o Paulo "da direita liberal".

Anti-sistema nas campanhas, o CDS precisa, depois das eleições, de voltar aos "responsáveis" negócios de Estado. Sem mais personagens para representar, alguém acredita que Portas ficará mais quatro anos a perorar no Parlamento? E quem sobrará para o acompanhar em tão ingrata tarefa?

Primeiro de cinco textos sobre as candidaturas às legislativas.

Daniel Oliveira

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