Na Sexta-Feira, o procurador-geral da República, foi ao Parlamento, responder a perguntas da Comissão de Orçamento e Finanças, por causa do escândalo BPN.
Em suma e com substância relevante, disse que o Ministério Público não está preparado nem especializado, para lidar com crimes económicos e financeiros. Assim mesmo, sem peias. E acrescentou que o sucesso no combate à criminalidade económica tem sido relativamente pouco. E mais ainda: o MP precisa de ter a humildade de reconhecer que precisa de ajuda. De quem? Das entidades que percebem um pouco mais do assunto: Banco de Portugal, Inspecção- Geral de Finanças, entre outras.
Eduardo Dâmaso, director-adjunto do Correio da Manhã, no Domingo, escrevia na sua crónica de Dia a Dia que o MP anda há duas décadas com este problema. Desde Cunha Rodrigues, como PGR, que o MP tem que pedir ao Governo a colaboração de inspectores da IGF ou ao BdP a investigação de crimes económicos de certa natureza.
No mesmo dia, Domingo, António Cluny do MP, declara muito simplesmente ao mesmo jornal que "A Justiça não está preparada para punir os poderosos". E ainda mais: "A Justiça não temn meios suficientes para dar uma resposta eficaz aos crimes económicos e de corrupção". Melhor: " A Justiça não foi pensada para punir os poderosos, mas para outro fim."
Estes factos, que já são proclamados publicamente, aparentemente sem qualquer reverberação de escândalo, são vergonhosos para uma democracia que se preze e só por si, deveriam fazer soar todas as campainhas do alarme público, por causa da ausência de garantias de uma investigação criminal competente e autónoma como a própria Constituição refere. Pois bem. Estes factos e afirmações de quem sabe, por estar por dentro dos problemas, teve quase zero referências na imprensa escrita do dia seguinte, tirando o Correio da Manhã ( o Público, pela mão de Ana Brito, nem cheirou o assunto, para além do habitual rodriguinho de factos desconexos). Teve mesmo zero referências, nos semanários de Sábado, o Sol e o Expresso, certamente já com as manchetes prontas para as impressoras replicarem e o assunto não dava para parar rotativas.
O Expresso, deu conta de um epifenómeno que obviamente, tem tudo a ver com o assunto: a própria CGD que já não merece a confiança dos estrangeiros, para empréstimos avultados. O Sol, refere o possível âmbito criminal do caso BPP. Estes jornais, olham para a floresta de enganos, nestes assuntos e escolhem as árvores a abater. O resto, afigura-se-lhes como um palácio para um qualquer boy.
E no entanto, o problema vem de há muito tempo, como Eduardo Dâmaso refere. Mais propriamente, vem desde o final dos anos oitenta, com a introdução do Direito Comunitário e os novos impostos de IRS, IRC. IVA e regras de cobrança e ainda do direito bancário e da bolsa surgido com as privatizações e o mercado bolsista.
Todas as questões jurídicas que foram surgindo, específicas desse sector importantíssimo para a economia de qualquer país, ficaram de algum modo à margem dos curricula normais dos cursos de Direito.
As matérias que lidam directamente com o mercado de capitais, bolsista, do direito bancário e especificamente económicas, não eram e não são ensinadas devidamente a estudantes do curso de Direito. Ao acabarem os respectivos cursos, ingressam no CEJ, onde frequentam outro curso de um ano ou dois, para se inteirarem dos aspectos, outra vez teóricos e também práticos das profissões forenses ligadas à magistratura. Nenhum juiz ou magistrado do MP, saiu do CEJ, com conhecimentos suficientes para lidar com os assuntos em causa, como reconhece e avisa o actual PGR, Pinto Monteiro. Por isso, a falta de preparação teórica e prática é notória, grave e de consequências à vista de quem souber ver.
No decurso dos anos, durante os anos noventa, as questões foram surgindo, sempre cada vez mais complexas e relacionadas com alguns processos mediáticos, como por exemplo o caso Moderna. Sempre que foi necessário analisar facturas, contratos, documentos contabilísticos e operações bancárias e bolsistas, o MP recorreu a entidades externas, do próprio Estado é certo, quando não foram essas mesmas entidades externas quem lhes enviaram as denúncias concretas sobre a criminalidade económico-financeira,de maior repercussão.
Foi isso que sucedeu nos últimos anos do século XX, com uma então prestigiada Inspecção-Geral de Finanças, onde trabalhavam verdadeiros especialistas e com reputada independência relativamente ao poder político. Este poder, ao longo dos anos, apercebeu-se, logicamente do fenómeno e tratou, como não podia deixar de ser, de colocar lá os seus peões de brega, para tudo continuar como dantes, do lado do sectarismo: é dos nossos, é para proteger; é dos deles, é para dizimar. A coisa está assim, agora. E não vai mudar, logicamente.
Durante alguns anos, a PGR de Cunha Rodrigues, depois de alertar para o fenómeno, conseguiu uma aberta: foi criado o NAT, o núcleo de apoio técnico, com pessoas especializadas e que davam apoio nessa área, a todos os magistrados do país que dele necessitassem. O primeiro responsável, foi, curiosamente, o procurador Daniel Sanches, agora na berlinda por causa do BPN.
Geralmente, tudo o que metia contabilidades e facturas, mais negócios bancários pelo caminho , sendo quase chinês para os magistrados, sejam eles juízes, sejam do MP, era tarefa do NAT. E depois, foi o que se viu e vê: os apoios escassos, os especialistas a rarear ou por mero voluntarimso e o NAT desnaturado, quase desde o início. O poder político, não quer que o incomodem e alguns acomodam-se bem com isso. em Portal da Loja
sábado, 10 de janeiro de 2009
A preparação da magistratura
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