Onde o nosso Comendador, compadecido, divulga a incrível história de uma senhora a queixar-se à Dª Elza Pais dos maus tratos e humilhações que vários homens lhe infligiram ao longo da vida.
Sou uma senhora já de certa idade e só agora soube que existia a Dª Elza Pais com a sua Secretaria de Estado da Igualdade, disposta a ouvir as queixas das mulheres simples como eu. Foi por isso que me dirigi aos seus serviços e lhes dei conta dos azares que fui tendo ao longo da minha atribulada vida, que tantas voltas e trabalhos me deu.
Em nova, eram centenas de homens que me queriam. Uns eram meios loucos, outros muito atrevidos. Lembro um Afonso, por quem me perdi de amores e que ia dando cabo de mim. Também tive um Tó-Zé, que era um doce, e outros casos passageiros, como um João, que era jornalista - e mal me lembro sequer dos outros.
Depois, mais crescida, casei com o António. E o que eu sofri com ele, meu Deus! Esse homem, a quem me entreguei contrariada pensando que pelo menos me daria a estabilidade necessária, revelou-se um tirano. Bateu-me, deixou-me por vezes exangue, torturou-me física e psicologicamente, mandou esbirros que para ele trabalhavam atrás de mim. Foram tempos de muito medo, de terror, em que andei por vezes escondida dele, com receio que me encontrasse com alguém que não fosse do seu agrado, ainda que nada de errado estivéssemos a fazer.
O António deu cabo de mim - e só agora reconheço que os anos que passei com ele foram anos perdidos, sem rumo, de pavor. Houvesse à época um serviço como o de Vexa, Dª Elza, e ter-me-ia queixado do António, obrigando-o a passar uma temporada na prisão. Mas não havia! Na altura achava-se bem - penso que até seria legal - maltratar uma mulher como eu, apesar de desprotegida e sem outra malícia que não fosse a de querer o melhor para os meus filhos.
Um dia, o António bateu com a cabeça e finou-se. Tive, então, um Marcelo, que me prometeu um jardim de rosas, mas vai-se a ver era como o outro, ou pouco melhor.
Foi depois o tempo de uma série deles, que me disputaram. Naquela altura ainda parecia viçosa, e havia muitos homens que me achavam graça, apesar de ser já mulher madura. O Vasco, que era louco, o Álvaro, que era charmoso mas que teria sido terrível se eu o escolhesse, e um senhor almirante, que era bom homem mas que dizia muitos palavrões, coisa de marinheiros.
Seguiu-se um Mário, dois Franciscos, um Aníbal, um António, um Zé Manel, um Pedro e um Zezito, que ainda anda cá por casa com ar macambúzio. Perguntam-me: alguém te tratou bem? E a minha resposta é não!
Cara Dª Elza Pais, a minha vida tem sido um tormento. Não há quem queira saber de mim. Seja pelo abandono total a que me votam, seja por roubarem o meu já depauperado pecúlio, seja porque arranjam outras com quem passam o tempo (o Pedro era danado), seja ainda por serem uns mentirosos, nenhum deles está isento de culpas. E se há apoio à vítima, que sou eu, terá de haver da sua parte, também, punição para os carrascos, que são eles, que por aí andam.
Foi assim que lhes falei, lá nos serviços. As senhoras foram muito simpáticas e disseram que iam pôr isto tudo em pratos limpos e que aqueles brutos haveriam de pagar o que me tinham feito. Foi, então, que uma delas me perguntou o nome.
- República - respondi eu.
- Nome curioso... E o apelido?
- Portuguesa!
Não sei porquê, o processo nunca mais andou para a frente. Dizem que está parado na Procuradoria.
COMENDADOR MARQUES DE CORREIA Expresso
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