O futebol, para mim, é uma simples modalidade desportiva. Isto é, um jogo de que gosto muito e sobre o qual julgo até saber alguma coisa. Porém, a gravidade assumida nos discursos de adeptos, dirigentes ou comentadores, o tom pesado com que se analisam, em horas televisivas ou páginas de imprensa, confrontos de emblema ao peito entre o pé-de-obra de empresas nacionais falidas, algumas de dissolução adiada por complacência bancária e cobardia pública, dá-me imensa vontade de rir.
Como a generalidade dos portugueses, tenho a minha preferência clubística, desagrada-me quando o meu clube perde, fico feliz quando ele ganha. E até me diverte, num estádio, exteriorizar sentimentos, protestar com o árbitro, fazer de "treinador de bancada". Mas distingo sempre, sem a menor dificuldade, a vida do jogo, as coisas sérias de um mero espetáculo, por mais motivante que ele possa ser. Por isso, e de há muito, recuso-me a transformar as derrotas em tragédias ou as vitórias em exaltações. Em toda a vida, nunca perdi um minuto de sono por qualquer delas.
Sei que nem toda a gente pensa como eu, que muitos levam a sério o seu sentimento clubista, que nele encontram um conforto grupal essencial ao seu quotidiano e talvez ao equilíbrio pessoal de afetos. Cada um é como é.
Talvez porque penso desta forma, chocou-me muito ouvir ontem a declaração de um energúmeno (assumo a plena responsabilidade pelo qualificativo) adepto do meu clube, um irresponsável de uma seita de apoiantes arruaceiros a merecer cadeia, que sintetizou na televisão, num discurso de anti-espanholismo primário a que já me tinha desabituado, tudo o que de nefasto o futebol pode trazer à sociedade. E pergunto-me se os órgãos de comunicação social portugueses não estão obrigados a não serem veículos neutros de sentimentos de xenofobia e agressividade criminosa.
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