Sentados na relva, vestidos e engravatados, dois burgueses conversam. Mas a protagonista do quadro é uma mulher nua, de carnes brancas como uma cortesã, cheia como era belo no séc. XIX. É ela que faz escândalo e leva à proibição do Déjeuner sur l'herbe quando Édouard Manet quis expor a tela no Salon de Paris, em 1863. Não foi a nudez que perturbou, o Louvre estava cheio de quadros com nus, mas, nesses, havia sempre um motivo para a nudez. A força da obra de Manet, a razão do escândalo, foi a razão nenhuma para mostrar seios, ventre e ancas. Esta semana, a revista The Economist pôs na capa o célebre quadro, com a mulher tal e qual, mas os dois burgueses transformados em Sarkozy e Hollande, os candidatos a Presidente francês. A revista, que é campeã da austeridade, titula "A França em negação" e insiste: "A mais frívola eleição do Ocidente." Enfim, a França não estaria a discutir as medidas duras que um ou outro, seja quem for o vencedor, terá de tomar quando for eleito. Daí o quadro, ilustrando a boa vida... Tudo bem não fosse um porém: como disse Émile Zola, um admirador incondicional do quadro ("o melhor de Manet"), a verdade do Déjeuner sur l'herbe é outra, é a deliberada vontade não fazer um discurso mas mostrar a realidade. Assim, o quadro pode ser elogio aos dois candidatos, de direita e esquerda, ambos capazes de ver, numa mulher nua, uma mulher nua e não o anúncio do papão dos mercados a chegar para ditar leis. por FERREIRA FERNANDES - DN
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