quarta-feira, 27 de junho de 2012

Vinte médicos em burla de 50 milhões.

Vinte médicos escolhem à sorte os nomes de falsos doentes. Utentes reformados a quem o Estado comparticipa alguns remédios em quase 100 por cento. E é esse tipo de remédios, de um lote de seis, que prescrevem – tornando brutais as margens de lucro da rede criminosa, que avia os medicamentos nas farmácias, à revelia dos utentes usados na burla, e os põe à venda em Angola. Médicos, farmacêuticos, delegados de informação médica e armazenistas estão envolvidos no esquema, que lesou o Estado em mais de 50 milhões de euros no último ano. Por isso, a Unidade Nacional de Combate à Corrupção da Judiciária avançou ontem para dez detenções em todo o País – dois médicos, dois farmacêuticos, cinco delegados de informação médica e um armazenista, que hoje serão presentes a um juiz em Lisboa. Mas a rede tem mais elementos – só médicos serão vinte –, a maioria já constituídos arguidos, que recebiam duas vezes. Do Serviço Nacional de Saúde, que paga a fatura dos remédios em Portugal, pensando estar a servir os utentes – quando estes nem sabem que os seus nomes são utilizados; e em Angola ou no mercado negro nacional, onde se paga outra vez por medicamentos desviados das farmácias e dos doentes que as utilizam. Com isto, o stock de remédios nas farmácias e em armazenistas entra em ruptura – pondo em risco a saúde de pessoas que precisam de tratar doenças graves. O Infarmed estava a investigar a falta de medicamentos nas farmácias; a Judiciária, em articulação com o Departamento Central de Investigação e Ação Penal, antecipou--se na resposta. Lyrica, Aclasta, Sinemet, Risperdal , Seroquel e Alzen – que tratam epilepsia, osteoporose, Parkinson, esquizofrenia e doença bipolar – são medicamentos em falta para quem deles precisa, porque têm, no último ano, estado ao serviço desta rede. Os delegados de informação médica vão ter com clínicos, que passam as receitas – e os primeiros aviam-nas nas farmácias, levando os remédios que o Estado há--de pagar. Depois é só pôr os remédios à venda – e repartir os lucros, de 50 milhões no último ano, por todos os envolvidos.

66 PROCESSOS POR EXPORTAÇÃO ILEGAL

A autoridade do medicamento (Infarmed) tinha instaurado 66 processos de contra-ordenação e aplicou 500 mil € em multas a armazenistas e farmácias por exportação ilegal de fármacos.

TIVERAM TODOS SORTE DIFERENTE DO FARMACÊUTICO NUNO GUERREIRO

Ao contrário do que acontecera em Março com o farmacêutico Nuno Guerreiro – suspeito de usar um esquema com testas-de-ferro na aquisição fraudulenta de farmácias e medicamentos, que não pagava aos bancos e a fornecedores, lesados em dezenas de milhões –, ontem, a procuradora Maria João Costa, do DCIAP, passou mandados de detenção. Enquanto Nuno Guerreiro e cúmplices foram só alvo de busca e apreensão – carros de luxo e iates –, os dez elementos da rede agora apanhada passaram a noite na cadeia e serão hoje presentes ao juiz Carlos Alexandre, no Tribunal Central de Instrução Criminal. Arriscam todos prisão preventiva.

APREENDIDOS CARROS DE LUXO COMPRADOS COM OS CRIMES

A maior parte das farmácias e dos suspeitos envolvidos na rede fraudulenta que lesou o Serviço Nacional de Saúde em 50 milhões estão instalados no Norte e no Centro do País. É o caso, por exemplo, de uma das mais conhecidas farmácias na rua de Santa Catarina, no Porto. No Norte, uma das médicas que foram apanhadas ontem na megaoperação da PJ trabalha no Centro de Saúde de Celorico de Basto. Em causa estão crimes de falsificação de documentos, burla qualificada e corrupção. No decorrer da operação de ontem, levada a cabo pela Polícia Judiciária em colaboração com o DCIAP, foram ainda apreendidos diversos… CM

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