quinta-feira, 26 de junho de 2014

duas ou três coisas

 

Alexander Stubb

Posted: 24 Jun 2014 05:14 PM PDT

Durante a negociação europeia do Tratado de Nice, que dirigi durante o primeiro semestre de 2000 e que acompanhei até à conclusão dos trabalhos, como chefe da delegação portuguesa, no resto do ano, o tema das "cooperações reforçadas" ou da "flexibilidade" (para simplificar: a possibilidade de só alguns Estados adotarem certas políticas dentro da União) foi umas das questões centrais. Graças à genialidade criativa de Josefina Carvalho, a diplomata portuguesa mais competente que alguma vez conheci em matérias institucionais europeias, e que por sorte me coadjuvava, colocámos sobre a mesa um conjunto "engenhoso" de propostas. Portugal foi mesmo a "vedeta" dessa discussão, que António Guterres depois titulou à mesa do Conselho europeu. 

 

Algumas delegações revelaram um interesse muito grande pelo tema e ajudaram a desenvolvê-lo, com inteligência e argúcia. Uma dessas delegações era a finlandesa, dirigida por um homem magnífico, com uma serenidade ártica, o embaixador Antti Satuli, um bom amigo infelizmente já desaparecido. Costumávamos dizer que a Finlândia desse tempo era quase um país do Benelux (Bélgica, Holanda, Luxemburgo), tal o sentido europeu do seu empenhamento, o sentimento federal das suas posições (onde isso vai...) Antti era então coadjuvado por um muito jovem diplomata, entusiasta, imaginativo, quase "latino", que com a nossa delegação mantinha uma relação de grande cordialidade. Longas conversas tivemos com ele, procurando convencê-lo do bem fundado das nossas propostas e, por vezes, tentando integrar algumas das suas ideias. Que eram muitas, porque o tema da "flexibilidade" apaixonava-o.  

 

Em 2002, já a negociação tinha terminado e eu vivia na Áustria e andava já por outras "guerras", recebi um pedido desse diplomata finlandês para poder utilizar um texto meu num livro que ia publicar sobre a questão da "flexibilidade". Enviou-me o livro meses depois, com uma carta muito simpática. Trocámos, depois disso, alguns emails e fui, entretanto, acompanhando o seu percurso, agora na política, de Estrasburgo ao governo do seu país, onde chegou a ministro dos Assuntos europeus e dos Negócios estrangeiros.

 

Alexander Stubb, o nosso jovem amigo finlandês das negociações europeias, é, desde ontem, o novo primeiro-ministro do seu país.

BES

Posted: 24 Jun 2014 01:43 PM PDT

Nos dias que correm, os bancos não são empresas como quaisquer outras. A banca está definitivamente colocada no centro do processo económico-financeiro europeu e não é por acaso que, nos últimos anos, é em seu torno que se desenvolvem os grandes debates da União. Os contribuintes europeus já sofreram na pele o custo da irresponsabilidade de alguns operadores bancários e os efeitos detrimentais das suas ações na estabilidade global do sistema. Os bancos parece serem privados enquanto dão dinheiro, mas passam a problemas públicos quando entram em crise.

 

Por essa razão, não é legítimo que os agentes políticos portugueses olhem para a crise no BES como se isso significasse apenas um emergir de problemas conjunturais numa qualquer empresa privada. O governo sabe que as coisas não são assim e, em nome dos cidadãos - e dos contribuintes - que representa tem de dar mostras claras de estar atento a uma saga que não se esgota nos meandros da família Espírito Santo. Longe disso! O argumento da separação de interesses não é válido e não pode ser esgrimido com ligeireza. Ou alguém tem dúvidas de que, se as coisas acaso correrem mal, alguém nos virá cobrar ao bolso? Deixemo-nos, pois, de formalismos ridículos e assumamos a importância destas coisas.

 

Neste contexto e nos dias que correm, a família Espírito Santo pode não estar à altura da responsabilidade do nome que herdou. As explicações absolutamente incríveis dadas sobre o que ocorreu na gestão dos interesses da estrutura financeira no Luxemburgo, somadas à patética irresponsabilidade revelada em Angola, agravadas pelas dissidências e conflitos públicos entre os familiares, que deveriam mostrar solidez e determinação num momento desta delicadeza, provam que estamos perante um grupo em real crise de liderança e objetivos. E ao ter optado por uma solução de continuidade, titulada em alguém que está ainda sob suspeita, não revela bom-senso e faz temer o pior, agora para o banco.

 

Espera-se que o supervisor, o Banco de Portugal, seja capaz de tomar as decisões que possam acautelar o interesse público. Com firmeza, transparência e sentido de responsabilidade.

 

 

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