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sexta-feira, 16 de agosto de 2013

As pragas do Egito

Francisco Seixas da Costa

 

Nestes dias de verão, volto a recorrer a textos do passado para evocar o presente. Aqui fica um post de há um ano e meio, que creio curioso revisitar:

 

Há uns anos, visitei, na sua casa no Cairo, um antigo e proeminente embaixador egípcio, que havia tido uma carreira brilhante, iniciada nos tempos de Gamal Abdel Nasser, que se prolongara pelo mandato de Anwar Al Sadat e se concluíra sob a égide de Hosny Mubarak. Era um homem altamente preparado, com imenso "mundo", que havia feito o circuito das mais importantes missões diplomáticas egípcias.



A conversa derivou, a certo passo, para a política, tendo eu evocado a sucessão de Mubarak. O tempo - foi há quase dez anos - das "primaveras árabes" estava ainda longe, mas ousei perguntar se não teria chegado o momento para uma abertura do regime, em direção ao pluripartidarismo, atenta a necessidade de esvaziar as tensões políticas.



O meu interlocutor olhou-me nos olhos e, embora nada surpreendido com a minha pergunta, para ele natural num observador ocidental, retorquiu-me: "Infelizmente, ao final desta minha vida, cheguei à conclusão que o Egito só pode ser gerido por um regime autoritário. As pessoas não estão educadas para a democracia e, se acaso esse sistema viesse aqui a ser introduzido, os extremistas islâmicos acabariam por transformar este país num polo de instabilidade. E os primeiros a sofrer seriam vocês, na Europa e na América, podem crer!".



Um amigo irlandês que me acompanhava nessa conversa olhou-me, na tentativa de perceber como iria reagir, já que tinha sido eu a suscitar a questão. Por respeito pelo idoso diplomata, arranjei um circunlóquio para evitar contraditá-lo, para lhe louvar as vantagens da liberdade, para lhe dizer que, também entre nós, havia quem dissesse que o povo português não estava preparado para a democracia e que, afinal, o sistema tinha-nos conquistado, sem sobressaltos de maior.



Há pouco mais de um ano, voltei ao Cairo. Recordo-me de ter notado, de forma muito nítida, o aumento de véus na cabeça das mulheres, em especial das jovens adolescentes. Confirmei que essa crescente tendência estava a impor-se, com muita rapidez, desde a minha última visita. Um outro egípcio, bem mais liberal, que tentava ajudar-me a interpretar a evolução do país, simplificou a realidade nestes termos: "Para as jovens egípcias, o véu é hoje uma espécie de farda...". Para logo acrescentar, baixando a voz: "Esperemos que não haja guerra!".



Hoje, lembrei-me destas duas conversas que tive no Egito.


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