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terça-feira, 2 de outubro de 2012

Secretário de Estado, Paulo Núncio, despachou sobre milhões dos grupos económicos ao arrepio da IGF!

 

“O despacho do secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (SEAF) que, em Outubro de 2011, veio ao encontro dos interesses fiscais dos grupos económicos, foi dado ao arrepio da Inspecção-Geral de Finanças.

Na auditoria ao sistema de controlo das deduções por dupla tributação dos lucros distribuídos - que está desde Agosto de 2011 no gabinete do SEAF e ainda aguarda homologação - a IGF considera que o método pelo qual o SEAF viria a optar meses depois não é o mais transparente e não permite um maior controlo da evasão fiscal.
Só em 2008, foram 9635 milhões de euros de lucros de 1577 entidades por tributar em IRC, com "impacto negativo" nas receitas fiscais. Foram 0,4% das sociedades que apresentaram deduções de 37% do lucro tributável e 49% da matéria colectável do conjunto das empresas.
Há meses que o PÚBLICO tenta aceder ao relatório da IGF, mas o gabinete do secretário de Estado impede esse acesso. O PÚBLICO tentou a intervenção da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos, mas a CADA considera que sem homologação não é possível.
Em causa está como evitar que o lucro de uma sociedade, transferido como dividendos para a sociedade-mãe, seja duplamente tributado.
Em plena crise de 2009, a questão tornou-se incómoda: a venda pela PT da operadora brasileira "Vivo" gerou aos seus maiores accionistas 6 mil milhões de euros isentos de impostos. Na altura, o Governo Sócrates mudou a lei. Até Dezembro de 2010, metade dos dividendos eram deduzidos ao lucro tributável quando provinham "de lucros que não tenham sido sujeitos a tributação efectiva" e exceptuavam-se as SGPS. Com o OE de 2011, todos os dividendos passaram a ser deduzidos só quando viessem de lucros "sujeitos a tributação efectiva". E pôs-se fim à excepção das SGPS.
Mas a alteração nunca se aplicou. Faltava saber o que era "tributação efectiva". Bastava qualquer pagamento de IRC algures na cadeia do grupo? Era caricato, mas a aquisição de um carro, tributada autonomamente em 3 mil euros, isentava milhões em dividendos.
A "batata quente" foi objecto de decisão da Direcção de Serviços de IRC a 23 de Fevereiro de 2011 (informação 813/2011). Optava pela verificação caso a caso e que os lucros distribuídos por SGPS isenta não eram "tributação efectiva". Mas a nota foi remetida a 19 de Abril para o Centro de Estudos Fiscais (CEF). O parecer ficou pronto a 25 de Maio, mas nada foi decidido pelo anterior Governo. As 15 páginas ficaram à espera do Governo Passos Coelho. Para SEAF, veio Paulo Núncio, militante do CDS, fiscalista e sócio da sociedade de advogados Garrigues. Núncio não respondeu ao PÚBLICO se tinha clientes que beneficiariam da sua decisão.
O parecer do CEF 26/2011 revelou opções contrárias às da DSIRC. Um dos seus autores foi convidado para o gabinete do SEAF. Em Agosto, a IGF entregou o seu relatório. Mas o documento nunca foi conhecido. No seu despacho de Outubro de 2011, o SEAF concordou com o parecer do CEF e as suas conclusões permitiram as leituras entusiásticas de consultores de que tudo seria "tributação efectiva". O entendimento é de que basta 1 euro tributado a montante para isentar milhões.
O SEAF disse ao PÚBLICO que as recomendações da IGF "foram tidas em conta" na circular 24/2011, baseada no parecer do CEF. Mas não respondeu à crítica da IGF. E não divulga o relatório porque "está protegido pelo dever de confidencialidade e sigilo fiscal".
O que diz o relatório da IGF
No entanto, no relatório de actividades do ano passado, agora publicado, a IGF faz um resumo das suas conclusões. Diz que "a dedução por dupla tributação económica é a mais expressiva de todas as deduções efectuadas" que reduzem a parte do lucro que é tributada.
O "método da dedução ao rendimento previsto no Código do IRC tem tido um impacto negativo em termos de receitas fiscais e tem suscitado grandes dificuldades quanto à determinação da existência de tributação efectiva a montante". Além disso, as sucessivas alterações à lei, supostamente para "melhorar o método de dedução ao rendimento (...), tiveram efeitos reduzidos ou nulos".
Essa ineficácia deveu-se à "falta de uma abordagem global e sistemática da Autoridade Tributária, através da definição de critérios uniformes sobre as situações". Mas também por "falta de uma actuação adequada da inspecção tributária".
Por isso, a IGF "considerou justificar-se que fosse ponderada a adopção do método de crédito de imposto, igualmente previsto na lei". Ou seja, a solução que implica uma avaliação caso a caso e que se aproximava da pretendia pela administração fiscal. Para a IGF, esse seria um método "mais transparente, propiciador de maior justiça fiscal e o mais adequado do ponto de vista do controlo das situações de evasão/erosão das receitas fiscais".

Publico

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