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terça-feira, 15 de outubro de 2013

O Nobel e a Noruega

Francisco Seixas da Costa

Como (não) é (às vezes) sabido, a designação do prémio Nobel da Paz - contrariamente a todos os outros prémios Nobel, que são atribuídos na Suécia - é feita pelo comité Nobel da Noruega. Invariavelmente, a entrega do prémio tem lugar no dia 10 de dezembro, no Rådhus, a câmara municipal de Oslo, pelo primeiro ministro norueguês, na presença do monarca do país. Conheço bem o edifício e a sala, respetivamente com uma arquitetura algo "brutalista" e umas discutíveis pinturas, onde me coube participar num jantar oferecido pelo falecido rei Olavo V ao presidente Eanes.

Quando, por alguns anos, vivi pela Noruega, travei conhecimento com um dos membros desse comité, que era amigo do meu primeiro chefe em Oslo, o embaixador Fernando Reino. Integrar o comité é uma função prestigiada, sendo os seus membros vulgarmente (à época, o que pode ter mudado entretanto) próximos do Partido Trabalhista. Infelizmente, esse meu conhecido nunca se revelou aberto a revelar-me o modo como as escolhas e decisões do comité eram tomadas. A consciência do prémio configurar um momento importante para a imagem externa do país, o que, para um norueguês, assume uma importância extraordinária, deve ser a razão desta reserva secretista. Mas, devo confessar, a metodologia de atribuição do galardão sempre me intrigou.

Este ano, o Nobel da Paz é concedido à Organização para a Proibição das Armas Químicas. A escolha foi criticada por alguns, por poder ser lida como transportando para o centro da questão síria apenas uma das vertentes do conflito no país, podendo assim ajudar Assad a, resolvido que seja esse problema, considerar que está legitimado noutras dimensões do seu bárbaro esforço de guerra. Mas nada disto é novo: muito frequentemente, as decisões do comité Nobel da Paz têm, no passado, sido controversas, às vezes bem mais do que este ano.

De há uns anos a esta parte, tenho para mim que as escolhas dos prémios Nobel da Paz acabam por ser um espelho muito interessante da própria mentalidade norueguesa. Umas vezes, a seleção segue uma lógica simples e conjuntural, foi o caso deste ano. Outras vezes, parece obedecer a uma "naïveté" quase deslumbrada, como foi o caso de Obama, que, à época, ainda não existia enquanto político com história a premiar. Não raramente, o comité optou por algumas ousadias, quase sempre muito "politicamente corretas", que lhe conferem uma imagem de "espírito de ONG" - e mais não digo...

Se olharmos com atenção, ao longo dos anos, para os nomes escolhidos para os prémios Nobel da Paz, quase que poderemos, através deles, descortinar o verdadeiro perfil psicológico desse país singular que é a Noruega - gente simples, preocupada com a "rightouseness", as mais das vezes algo óbvia, mas sempre séria e "modestamente" surpreendida com o facto do mundo teimar em não se lhe assemelhar.


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