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quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Um país sob suspeita

 Paquete de Oliveira
 
Não é só o primeiro-ministro que é acusado de estar sob suspeita. É todo o país. Desconfio de que este estado geral de suspeita que está criado seja uma via segura para sairmos desta crise.
 
Uma crise que começou por ser declarada financeira. Obviamente passou a ser económica, mas é, sobretudo, uma crise profundamente social. E está a atingir o grau zero de qualquer crise existencial. Está a minar a própria crença na identidade nacional.
 
Enrolámo-nos de tal modo nesta teia de aranha que nem os próprios arautos proclamadores deste estado geral de suspeita parecem tomar consciência de que eles próprios estão sob suspeita. Suspeitas de outro teor, é certo, mas sob suspeita. Não são só condutas por eventuais actos ilícitos ou ilegítimos em matéria económica financeira ou de garantias de um Estado de Direito que geram suspeitas na ordem social ou na opinião pública. Entre o povo, as suspeitas podem ter as mais inusitadas razões. Mas não deixam de criar os mais insondáveis efeitos.
 
Politicamente, a própria presidente do PSD, Manuela Ferreira Leite, ao declarar em plena Assembleia da República que o primeiro-ministro José Sócrates está sob suspeita, não terá, porventura, a consciência de que a própria instituição de primeira grandeza nacional onde é feita essa acusação frontal está sob suspeita popular. Faça-se um inquérito à nação sobre o que o povo diz e verdadeiramente pensa da actual ordem política. Por outro lado, nem repara, ou quer disfarçar (o que me custa a crer dada a sua reconhecida honestidade de carácter) que o seu partido, um partido que, neste momento, seria imprescindível para sairmos da crise, está sob suspeita. Pelo que se vê, suspeitam os seus próprios e naturais eleitores. Aliás, suspeitam-se uns aos outros dentro daquela "casa". Não é preciso abrir inquérito. As evidências estão na rua.
 
Mas este caso é só um caso. Importante sem dúvida. Na praça pública adensam-se as suspeitas sobre tudo. O défice das contas públicas não será aquele que o Governo indica. O endividamento ao exterior ainda tem algumas somas por calcular. A saga do "Magalhães" está sob suspeita. O buraco do BPN não conhece fundo. A vacina contra a gripe A (H1N1) está sob suspeita. Querem fazer querer que pode matar. Os números dessa grande catástrofe nacional, o desemprego, não são dados correctos. As fontes oficiais não são dadas como credíveis. Há desempregados que estão a trabalhar. As "Novas Oportunidades" são uma "trafulhice", diz o professor Medina Carreira, bem como "todos os actuais estudantes deste país são uma 'tropa fandanga' e não sabem nada". Enfim, "Portugal é uma miséria".
 
Com todas estas desconfianças, fundamentadas ou não, mas propaladas aos quatro ventos, não será este país um país sob suspeita?
 
José Sócrates sabe como têm sido geradas todas as suspeitas que recaem sobre ele. O Governo e o PS não podem ignorar. Nem iludir ou iludir-se com a hipótese das campanhas negras. Os factos públicos valem, não pela suposta verdade ou mentira, mas pela força de eficácia social que têm. E neste momento, embora todo o país esteja sob suspeita como venho a admitir, quem governa o país é que tem a responsabilidade política de desmontar, desfazer as suspeitas. Este é maior problema da actual gestão política do país. Maior do que todos os outros. Um país sob suspeita não vai a lado nenhum. JN

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